A jornalista Daniela Arbex impressionou, em 2013, com o excelente livro-reportagem Holocausto Brasileiro. Forte e impactante, a obra retrata os maus-tratos que pacientes recebiam no Hospital Colônia de Barbacena. Depois, a autora voltou a chamar a atenção com Cova 312, comprovando sua qualidade e que não é sucesso de "um livro só". Agora, porém, chega às livrarias o mediano Todo Dia a Mesma Noite, sobre a tragédia da Boate Kiss.
O novo livro, editado pela Intrínseca, sem dúvidas chama a atenção pelo título -- uma sacada da editora, segundo Arbex -- e pelo próprio fato narrado pela obra. Afinal, a tragédia da Boate Kiss, ainda que tenha completado cinco anos no início de 2018, permanece fresca na memória dos brasileiros. Mais de 200 jovens morreram em um dos mais trágicos e infelizes incêndios da história de todo o mundo. É natural que haja curiosidade.
O ímpeto para a leitura, porém, vai se arrefecendo conforme se avançam as páginas. Arbex opta por mostrar detalhes da vida de familiares afetados pelo incêndio. Mais da metade do livro é sobre pais recebendo a notícia, mães sentindo que não iam mais ver os seus filhos, pais relembrando a última despedida. São momentos tocantes, mas que acabam cansando capítulo após capítulo. É difícil lembrar nomes e, com isso, entender a vida de cada um.
E quando parece que essa descrição interminável vai acabar, ela dá um giro em 360º e volta para o mesmo lugar. Continua a narrar a chegada de bombeiros ao local, como foi a vida dessas pessoas na noite da tragédia, e por aí vai. É uma decisão humana de Arbex, que valoriza essas pessoas que passaram pela tragédia e ficaram marcadas na história recente do País. Mas, para um livro-reportagem, falta um pouco mais de conteúdo.
O ritmo da narrativa só melhora nas últimas cinquenta páginas, quando Arbex começa a fazer um trabalho investigativo sobre os erros da Boate Kiss, sobre como foi o desenrolar dentro do local durante o incêndio e os diversos erros cometidos pela equipe de administração e segurança. Porém, isso tudo passa batido, quase esquecível, e sem muito aprofundamento -- bem diferente do que ela fez, por exemplo, em Holocausto Brasileiro.
Ao final, percebe-se o quão importante é Todo Dia a Mesma Noite para familiares de vítimas, jovens que estavam no local e, inclusive, para compôr de forma mais clara e menos míope o que se desenrolou na cidade de Santa Maria. Mas falta intensidade, falta um pouco mais de investigação sobre o fato em si e, principalmente, sobre aspectos pouco conhecidos da tragédia. É um livro importante, sim. Mas que, infelizmente, logo será esquecido.
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