Logo que peguei Sol Descalço nas mãos, obra do poeta Carlos Cardoso, fiquei encucado. O que queria dizer aquele título? Oras, quando penso em sol, logo lembro de fogo, de chama, de ardência. É também a luz pálida da manhã, a luz amarelada da tarde e a ausência da noite. Já o descalço me lembra algo leve, suave. Ficamos descalços na terra, na água -- não na chama.
Assim sendo, o livro de Carlos começa com um embate de ideias já no título. E isso não é à toa. Ao longo das poesias, que mesclam estilos e temáticas, vemos vários embates de ideias. Amanhecer e entardecer (introdução), gritos e sussurros (Sussurros), dia e noite (Eu Serei Noite e Serei Dia) e por aí vai. O poeta entrelaça emoções, sentimentos, sensações junto às palavras.
Além disso, ao longo dessas 70 páginas, vai se descortinando a partir dessa mistura e contraposições. Em poemas que vão fundo, apesar de uma delicadeza estética que não se impõe em cima das percepções do leitor, Cardoso fala sobre assuntos existenciais: morte, dor, leveza, despertar, medo, ousadia... São temas que surgem naturalmente enquanto o autor se despe.
Também traz aspectos fortemente calcados em aspectos religiosos, visitando o sacrilégio, também passeando nessas temáticas existenciais. Essas temáticas, que começam de maneira mais leve e com pinceladas inesperadas, vai ganhando tons mais robustos no final, em poemas fortes como Tudo é pequeno demais para caber nas asas dos anjos e O Caminho dos Cavalos.
Ao final, saímos da leitura impactados com o que se derramou nas páginas. Sol Descalço ganha intensidade na reta final, como um bom filme que nos surpreende com uma reviravolta. No entanto, Carlos surpreende em Sol Descalço com o rebuscamento literário que avança, a força do existencialismo que prospera e, ainda assim, a delicadeza das palavras que supera tudo.
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