Selma sonhou com ocapi. Se você não sabe, te explico: ocapi é um animal estranho, que parece realmente saído de um mundo fabular, cuja anatomia lembra a mistura de uma girafa, um cavalo e uma zebra. E quem é Selma? Bom, aí é outra história. Essa é a personagem do livro O Dia em que Selma Sonhou com um Ocapi, obra publicada pela Planeta de Livros aqui no Brasil.
Escrito pela alemã Mariana Leky, o livro parte da crença de uma cidade de que Selma, uma idosa moradora da região, tem um dom (ou seria maldição?). Como adianta o título em português, toda vez que ela sonha com esse estranho animal, alguém da cidadezinha morre. Logo, quando surge o ocapi nas lembranças, os vizinhos ficam em polvorosa. Quem vai morrer? Quem vai?
Louise, a neta de Selma, é a responsável por narrar essa história. Logo, entramos na trama de O Dia em que Selma Sonhou com um Ocapi a partir de uma visão de terceiros -- não mergulhamos, logo de cara, na mente, nas emoções e nos sonhos de Selma. Passamos por esse filtro. E isso é essencial para que a obra de Leky adquira os seus principais pontos positivos.
Primeiramente, a história -- que lembra um pouco do tom adotado por As Desventuras de Arthur Less, outro bom livro que falamos por aqui -- não se deixa ser encaixotado, etiquetado. Tem drama, tem romance, tem humor. E essas emoções, que poderia soar forçadas nas mãos de um autor que quer apenas tentar mostrar personalidade, aqui soam naturais, complementares.
Afinal, Leky consegue criar uma boa base para o romance (os tais sonhos de Selma, que agitam a cidade) para que, como se fosse um mosaico, o livro pudesse trazer essa diversidade de sensações que circundam a personagem. Se não houvesse essa multiplicidade, o livro seria oco, vazio. Afinal, como ter apenas um tipo de reação, consequência a partir dos sonhos de Selma?
Há algumas derrapadas aqui e ali ao longo das pouco mais de 310 páginas do livro. Alguns personagens em situações pouco críveis, algumas tentativas forçadas de reflexão. Mas tudo bem. O Dia em que Selma Sonhou com um Ocapi é um livro que, em sua alma, é verdadeiro. O ocapi, no final, ganha o status de símbolo, de figura que transcende o mero sonho de Selma.
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