Demorei mais tempo que esperava para escrever o título acima. Há um limite de caracteres na plataforma e o título deste livro quase toma conta de todo o espaço. E aí, enquanto pensava no que fazer, olhei pela janela. E dei risada. Afinal, é sobre essa fuga de tempo, espaço e solidão que se resume Do Tempo em que Vouyeur Precisava de Binóculos, livro de jornalista carioca Luize Valente, que faz sua estreia na ficção.
Dona de um tipo de prosa moderna e ágil, Valente conta três histórias em seu livro -- que começa a acertar pelo título, provocando uma reflexão interessante e imediata. A primeira é a de um homem, machucado, que precisa ficar em casa. Assim como em Janela Indiscreta, de Hitchcock, ele começa a observar seus vizinhos e a fantasiar romances, aventuras, amizades. Mas será que tudo aquilo está acontecendo de fato?
Na segunda história, uma mulher é obrigada a mudar de País. Com isso, uma avalanche de solidão atinge sua vida. É aí, então, que ela começa a viver um interessante, delicado e intenso momento de libertação pessoal, sexual e de relacionamentos. Por fim, há uma terceira história sobre um casal que não se encontra. Por mais que morem na mesma casa, os conflitos são mais intensos que o amor. Ambos estão presos em si mesmos.
Obviamente, como qualquer história episódica, há altos e baixos. Aqui, em Do Tempo em que Vouyeur Precisava de Binóculos, há uma crescente na qualidade. A primeira história é boa, mas demasiadamente parecida com o filme de Hitchcock -- por mais que não tenha uma conclusão policial. A total sensação de déjà-vu vu, porém, é muito mais forte.
Já a segunda trama começa a ganhar corpo, força. A intensidade da história de vida da protagonista Eva. Aqui, a narrativa é um pouco mais densa do que o conto anterior, ainda mais com a inserção de trechos de diário da personagem. Mas, mesmo assim, a história flui melhor. Eva, por mais que comece enigmática, vai se desdobrando e se revelando a cada página. É linda a transformação que Luize consegue pôr na história.
Mas o ápice, e que faz jus ao título do livro e fecha com chave de ouro, é a terceira história. O casal desencontrado, apesar de parecer tema batido, adquire uma camada intensa de reflexão. A transição entre cômodos durante a narrativa também ajuda a alavancar a força da história -- fora o ar contemporâneo que ganha o livro como um todo. Mais do que nas outras duas histórias, há uma intensidade aqui que machuca.
Afinal, nunca é fácil ver um casamento desmoronando. Uma história chegando ao fim.
Do Tempo em que Vouyeur Precisava de Binóculos é um livro curioso, sim. A começar pelo título, que já desperta reflexão, e passando pelas histórias que transitam entre análises de tipos humanos que, no tempo em que já não se usa binóculos, se perdem ou se resinificam. O mais interessante, porém, é notar como é bom olhar para fora de vez em quando. Eu arranjei um título pra resenha. Outras pessoas podem rever o que são.
Comments