Geralmente, quando uma história indígena chega aos cinemas, é documentário. Nada contra, pelo contrário: é importante ter o documentarista registrando aldeias e indígenas ao redor do Brasil, mostrando costumes, pessoas e cotidianos que geralmente são apagados sistematicamente. No entanto, é bom ver um pouco de ficção indígena, ainda mais quando essas histórias são contadas em bons filmes. É o caso de Para'í, estreia desta quinta-feira, 20 de abril.
O longa-metragem conta a história de Pará, menina guarani que encontra por acaso um milho guarani tradicional, que nunca havia visto e, encantada com a beleza das sementes coloridas, busca cultivá-lo. A partir dessa busca, começa a questionar seu lugar no mundo, quem ela é, por que fala português e não guarani, por que é diferente dos colegas da escola, por que seu pai vai à igreja Cristã, por que moram numa aldeia tão perto da cidade, por que seu povo luta por terra.
"Sempre fazem documentários, seja um filme-denúncia ou um filme de preservação da cultura. Minha ideia e meu desejo era de estar no lugar do meio de ser uma proposta política, mas também fazer um filme que não fosse só do aspecto de denúncia e memória. Eu queria contar essa história como um artifício político de trazer pra perto, entender por dentro aquela aldeia", contextualiza o cineasta Vinicius Toro, em entrevista por vídeo ao Esquina.
E realmente é algo que funciona: lembrando até mesmo o que o filme canadense A Pequena Guerreira fez, falando sobre uma jovem indígena vivendo entre dois mundos, Para'í explora o que essa menina está passando e pensando durante o seu crescimento. Em um momento, está em sua tribo participando de rituais sagrados que percorrem centenas (milênios?) de anos de história. Do outro, está na aula de informática dizendo que tem, sim, uma conta no Facebook.
A importância de contar histórias
Com isso, Vinicius reafirma a importância de fazer um filme de ficção e não um documentário. Oras, a história e a linguagem dos indígenas foram tiradas deles no período de colonização: com o uso da língua portuguesa em solo brasileiro, línguas de povos originários foram suprimidas. Histórias dessas pessoas, comunidades e sociedades foram ficando cada vez mais restritas. Hoje, há um processo de resgate disso, seja por políticas públicas, literatura e, claro, cinema.
Contar a história de Pará é falar sobre os costumes e dilemas de uma tribo, hoje, mas de olho em toda a história dos Guarani em São Paulo. "O Brasil é muito rico e muito cruel pelo mesmo motivo. É polifônico, com muitas culturas, manifestações e línguas", diz o diretor. "Tem o português e as línguas indígenas, como uma coisa só paralela. É muito diferente a situação por conta de toda História. O cinema é uma forma dos indígenas contarem as suas histórias".
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