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Matheus Mans e Bárbara Zago

Opinião: 'Emoji' é uma aula de como não escrever um roteiro


Não preciso bater na tecla de que Emoji: O Filme é uma das piores coisas já feitas para o cinema nos últimos anos. Dezenas e dezenas de críticas, em todo o mundo, já deixaram isso muito claro -- algumas, aliás, chegaram a adjetivar o filme com o próprio emoji do cocô para evitar linguajar inapropriado. Por isso, aqui não vai ser uma crítica tradicional, em seu estilo clássico. Quero falar sobre como Emoji é uma aula do que não fazer com um roteiro de cinema.

Antes de tudo, vamos estabelecer algumas diretrizes de roteiro para cinema. Para isso, vou recorrer às analogias ruins: pense no roteiro de um filme como uma casa. Em sua estrutura, há a premissa da história. É a ideia principal que irá guiar todo a construção do filme, é o alicerce que dá segurança e potencial para o resto ser desenvolvido, como os diálogos, a profundidade de personagens, criatividade de situações e o sentimento da história. São, em sua essência, a janela, a porta e o telhado.

Emoji, então, erra já na construção de seu alicerce, de sua estrutura, com uma premissa ruim. A história, basicamente, acompanha o emoji Gene que busca identidade própria após não conseguir transmitir a emoção correta em uma mensagem de celular. Quando seu dono o escolhe, sempre vai uma carinha diferente. A partir daí, junto com o emoji High Five, Gene irá transitar no sistema do celular para encontrar sua personalidade e ser um emoji oficial dentro dos aplicativos.

Notou algumas semelhança? Pois é: a estrutura de Emoji é muito, muito, muito parecida com a de Divertidamente. Apesar de um lidar com figurinhas virtuais e outro com emoções, os dois filmes mostram um protagonista que busca encontrar sua identidade real em ambientes que são parecidos até mesmo em sua geografia -- o “parque dos sonhos e emoções” de Divertidamente é absurdamente igual à jornada de Gene dentro do sistema do celular e dos aplicativos.

Além disso, todas as ações de Gene dentro do celular ganham reflexos na vida real do dono do dispositivo. A diferença, de novo, está no efeito: enquanto as ações das emoções geram sentimentos, a dos emojis se tornam simples mensagens de texto. No final, o efeito de Emoji beira o patético e, ao contrário do filme da Disney, não há nada a acrescentar para a audiência em termos de significado narrativo ou de impacto para o público que está vendo a película.

Aí já está o erro que gera consequências em todo o filme. Aparentemente, a Sony voltou a imprimir seu desejo de criar coisas genéricas. Assim como forçou Sam Raimi a criar mais um filme de heróis qualquer em Homem-Aranha 3, a produtora de filmes, aparentemente, tentou usar o material base dos emojis para desenvolver uma trama com ares da Pixar e se equiparar com clássicos do estúdio em termos de história e “mensagem” a ser transmitida com a animação.

A partir daí, todas as outras construções essenciais ficam defeituosas. O mais grave é a questão dos diálogos, que não encontra o público em toda a sua trama. Afinal, a premissa é uma história bobinha, para crianças de três a sete anos. O roteiro, porém, não se acha: por tratar de um tema pertinente ao mundo da tecnologia, muitos termos são específicos e não fazem parte do universo do público que assiste o filme. Qual criança de quatro anos sabe o que é um malware ou um firewall?

Falta um roteiro que encontre seu público desde sua essência. Na sessão onde estava, as crianças riram apenas de piadas envolvendo cocô e uma ou outra piada envolvendo humor físico das personagens. Quando entravam tramas envolvendo sistemas do celular, faltou didatismo. O que se ouvia na sala era só uma coisa: o que é isso? O que ele está fazendo? Onde ele está entrando? Não é correto agir como se crianças soubesses o que é Spotify ou Dropbox -- que são, de alguma forma, até importantes para a trama.

Aí já chega um outro erro: o filme tenta, desesperadamente, passar mensagens boas ao longo da exibição, como a necessidade de uma identidade própria, a importância de expressar seus sentimentos e a importância da mulher na sociedade. No entanto, tudo isso é surrado em uma história maçante e, como já apontado, genérica. Não há naturalidade em nada que é dito ou mostrado. Com isso, parece que o filme tenta justificar sua existência e mostrar a importância para os pais.

Esta necessidade também esbarra no mesmo erro dos diálogos. Enquanto a trama vai para um sentido, as conversas e situações vão para outra. Há diálogos que ficam reforçando toda a importância da mulher na sociedade, por exemplo, mas há um momento em que um personagem solta: “cala a boca, piriguete”. Isso mesmo: um filme infantil tem um diálogo que só reforça ainda mais o preconceito de gênero, sem nenhuma lição sobre como aquilo é errado. É uma frase solta no ar.

No final, a estrutura desaba. É inevitável. Com uma premissa genérica, os diálogos, cenas e o próprio sentimento do filme não conseguiram se encontrar. Curiosamente, um filme que prega tanto para que as pessoas sempre busquem sua personalidade não consegue criar a sua própria, ficando perdido num mar de mesmice e sem conseguir passar uma mensagem de maneira clara, límpida e respeitável para sua audiência, que fica perdida em tamanho fracasso de roteiro.

No final, só fica uma lição: quer aprender a escrever um bom roteiro? Assista Emoji, o filme e faça exatamente o contrário. No mínimo, você terá uma história original em suas mãos.

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