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Foto do escritorMatheus Mans

Final explicado: qual o significado por trás de 'Cam', da Netflix?


Cam, da Netflix, é um dos lançamentos mais surpreendentes da plataforma de streaming. Do subgênero "terror tecnológico", que tem ganho cada vez mais força nos cinemas, o longa-metragem tem uma história assustadora, nos moldes de Black Mirror, e uma trama difícil de compreender num primeiro momento. Afinal, o roteiro de Isa Mazzei acerta ao abrir duas possibilidades: uma interpretação lógica, linear e puramente tecnológica; e outra metafórica, com sentido social e psicológico. Nenhuma é simples.

O Esquina, então, explica abaixo as duas possibilidades de interpretação e deixa pra você, leitor, entender o que mais faz sentido dentro de sua experiência. E é claro, há spoilers no texto abaixo:

Interpretação linear

A primeira possibilidade de compreensão da trama é entendê-la de forma totalmente lógica, cronológica e linear. Nesse sentido, o que se revela na trama é que a personagem de Lola (Madeline Brewer) teve sua identidade clonada pelo serviço de cam girls -- talvez até pelo próprio fã e profissional da TI, Tinker (Patch Darragh). Já existem hoje, afinal, softwares que inserem rostos de personalidades em situações que elas não viveram. Há vários casos, inclusive, de celebridades que tiveram sua identidade acrescentada em cenas de filmes pornográficos. É a chamada deep fake, tecnologia que preocupa.

O que pode ter acontecido com Lola, seguindo essa linha de raciocínio, é que Tinker absorveu todas as horas e horas da personagem se exibindo na câmera e, assim, fez o clone virtual perfeito em um software próprio. Depois disso, só foi preciso hackear a conta dela no site de cam girls e deixar o software criar e convencer os seguidores de que ela é a pessoa real. Uma prova disso está na coincidência de algumas palavras dita por ela e por Baby, a líder do ranking na plataforma de cam girls. Difícil elas falarem a mesma coisa e, principalmente, se encontrarem na casa da protagonista sem ela ver algo.

Interpretação alegórica

A interpretação mais interessante de Cam, da Netflix, está na metáfora que carrega a trama. Lola deixa bem claro que segue regras próprias de não se exibir explicitamente na sala de cam girls para preservar sua família e sua identidade -- há apenas nudez parcial em suas apresentações públicas. No entanto, a coisa muda de figura quando ela topa participar de um jogo com uma amiga e, assim, usar um vibrador muito potente, que chegou a tirar a sensibilidade sexual de algumas outras garotas. É a partir desse momento que Lola ganha essa outra identidade. E o que seria isso se não a perda de sua personalidade? Afinal, de uma hora pra outra, a personagem se torna a mesma que todas as outras.

O filme, assim, é uma alegoria da despersonalização de sites de cam girls -- e, porque não, de pornografia no geral. A personagem se sujeita a participar de algo que não gosta apenas para ficar mais forte na engrenagem. Se torna apenas mais uma na multidão, mais uma pessoa que não pode colocar seus desejos e anseios na frente do trabalho de exibição. Não é à toa que, a partir disso, ela faz tudo que não queria: exibe sua família, tem orgasmos nas exibições públicas, fala besteiras, não liga para os efeitos das ações que toma. São duas pessoas, assim, que coexistem. A Lola que ainda segue suas regras e que não se enxerga mais naquelas exibições, e a Lola que faz de tudo para ganhar posições no ranking.

 

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