Lá pelos anos 2000, o mundo se maravilhou com o longa-metragem X-Men: O Filme. Primeira história com os mutantes, o filme foi o renascimento do gênero de heróis, que andava muito desgastado por conta de fracassos como Batman & Robin e os trágicos — mas atualmente cultuados — Liga da Justiça e Quarteto Fantástico. Foi, basicamente, o início das franquias como conhecemos, assim como o aprimoramento das técnicas de efeitos especiais e roteiros mais afinados.
A partir daí, o gênero foi se adaptando e se transformou ainda mais. Deixou de ser sisudo e passou a ter piadas e escapes cômicos. Para a Marvel, se tornou uma mina de ouro e, para o cinema, se tornou referência para jovens. Agora, nada mais justo que outro longa-metragem dos mutantes crie um marco no gênero: Logan, novo filme solo de Wolverine que marca a despedida de personagens e atores queridos, como Hugh Jackman e Patrick Stewart como Professor Xavier, e que dá um novo respiro ao gênero cada vez mais desgastado.
Baseada na HQ Velho Logan, o filme se passa em 2029. Os mutantes quase não existem mais. Em cena, apenas Wolverine, Charles Xavier e Caliban, mutante albino e que consegue rastrear pessoas em um raio de 40 km. Ao contrário do que se passa em outros filmes, Wolverine está cansado. Com cabelos brancos e barba por fazer, Logan não tem mais a mesma força e agilidade de antes. Nem seu corpo se recupera com a mesma agilidade. Melancolicamente, ele se parece com um mortal.
Enquanto isso, o Professor Charles Xavier, vitima de algum tipo de doença neurológica, já não consegue controlar seu poder. Para aquietar a mente, o professor — que vive dentro de um grande tonel — toma remédios e fica completamente dopado. Apesar de ainda ter ótimas falas e dar conselhos importantes, ele também já não é mais o mesmo. Do personagem de outra época, apenas a sombra.
Neste cenário, conhecemos Laura, uma criança quieta e que, quando provocada, mostra seu lado Wolverine — com garras e corpo indestrutível como o de Wolverine. Sozinha, ela passa a ser perseguida por um grupo que caça mutantes concebidos em laboratório. Assim, Logan e Professor Xavier começam uma longa e extremamente difícil jornada para encontrar um lugar seguro para Laura, em uma trama grandiosa, certeira e sem grandes erros. É um road movie — ao estilo de Pequena Miss Sunshine — fora dos padrões para os filmes de heróis.
Para isso, o roteiro é ritmado e conta com nuances dramáticas aprofundadas. É emocionante nos momentos certos e tira o fôlego do espectador quando precisa, sem deixar a emoção cair. A atuação dos personagens acentua ainda mais a história. Hugh Jackman está impecável. O cansaço está nos olhos do personagem e a dor está em cada um de seus movimentos. Não duvido que a sua força interpretativa perdure e chegue viva às competições de 2018, como no Globo de Ouro e, em caso de milagre, no Oscar.
A grande força, porém, vem da pequena Dafne Keen, intérprete de Laura. Com pouquíssimas falas, a garota convence como a mutante sem futuro e sem destino certo. É um daqueles talentos mirins que impressionam — ainda mais por ser a primeira grande atuação da menina, de apenas 12 anos. Só torcer para que ela não siga caminho de crianças famosas dos anos 2000, como Haley Joel Osment, de O Sexto Sentido.
O diretor James Mangold — dos ótimos Identidades e Garota, Interrompida e que já tinha trabalhado com Jackman em duas ocasiões — também acertou na condução da trama. Sem medo de chocar, ele faz Wolverine ser o que é: violento, assustador, sanguinário. É algo não visto antes em filmes de heróis. Neste quesito, Logan é o que Watchman, há alguns anos, tentou ser. Violento sem filtros e sem medo de chocar.
As falhas do filme são apenas pontuais, mas fazem com que Logan não se torne o novo Cavaleiro das Trevas. A primeira é a repetição de certos acontecimentos. Por exemplo: Wolverine corta a cabeça de várias pessoas ao longo do filme. Uma ou outra vez, tudo bem. Mas mais que isso cansa o espectador, por mais surpreendente e impactante que seja. Além disso, o filme tem o defeito de todos os filmes da Marvel: vilão fraco.
Muitos podem dizer que o vilão de Logan é o tempo ou, até mesmo, o próprio Wolverine. No entanto, o diretor insiste em colocar o mediano (e clone de Ryan Gosling) Boyd Holbrook. As ambições dele não são claras e a motivação não impressiona. Seria melhor se ele fosse apenas um catalisador da história, deixando as coisas acontecerem em seguida — para que, a partir daí, Wolverine fosse seu próprio e sombrio vilão.
No final, mesmo com pequenos problemas, Logan é o renascimento do gênero, que já começava a ficar desgastado. É sério, adulto, visceral. É um daqueles filmes que chocam e que não sai da cabeça de quem o assiste. Tudo isso coroado por um final corajoso e que abrirá ainda mais precedentes para filmes futuros dos mutantes.
ÓTIMO
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