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Bárbara Zago e Matheus Mans

Crítica: ‘Três Anúncios para um Crime’ renova gênero de faroeste


Os irmãos Coen se consolidaram com um gênero único: dramas existenciais, envolvendo personagens marginais e com situações absurdas, criando junto ao drama uma verdadeira comédia de erros. Desde então, vários cineastas tentaram copiar o estilo e a maioria falhou terrivelmente -- como Sam Raimi e Jill Sprecher. Agora, porém, o diretor americano Martin McDonagh apresenta Três Anúncios para um Crime, filme ousado e divertido que reverbera nas melhores obras dos Coen.

Com ar de faroeste moderno parecido com Onde os Fracos Não Tem Vez e com um humor afiado em situações graves, como em Fargo, o ótimo Três Anúncios para um Crime acompanha a história de uma mulher (Frances McDormand) que coloca três outdoors na estradinha na pacata Ebbing. Seu conteúdo? Frases ácidas cobrando a polícia de solucionar o assassinato de sua filha, morta e estuprada alguns meses antes.

Cria-se, então, um reboliço na cidade. O xerife (Woody Harrelson), por exemplo, precisa lidar com vários dramas que atingem sua vida: um câncer terminal no pâncreas, o adeus à família e a busca desenfreada ao assassino. Enquanto isso, o policial Dixon (Sam Rockwell) fica inconformado com a situação e tenta buscar meios ilegais para reparar o caos que os outdoors geraram. Ainda temos pinceladas do irmão da menina assassinada, do dono dos outdoors e de outros vizinhos do local.

A partir daí, McDonagh cria o melhor filme de sua carreira -- e olha que Sete Psicopatas e um Shih Tzu é divertidíssimo e muito bem feito. Afinal, Três Anúncios para um Crime acerta em absolutamente todos os aspectos primários de um filme: desde o roteiro, escrito pelo próprio McDonagh, passando pela trilha sonora interessantíssima e chegando até à direção firme e as atuações memoráveis de todo o elenco. É uma daquelas obras raras que acertam quase tudo. Vamos aos detalhes.

Primeiro, o elenco. As atuações são primorosas: Harrelson faz seu melhor trabalho desde True Detective e consegue entregar um personagem se despedindo da vida, mas que ainda tem espaço para rir do absurdo que o cerca. Sam Rockwell, mesmo com bom desempenho em O Verão da Minha Vida, mostra total competência em papéis mais carregados. Peter Dinklage, Lucas Hedges, Caleb Landry Jones e Sandy Martin fazem ótimos trabalhos, mas com menos espaço em tela.

O grande destaque, porém, está nas mãos de McDormand. “Musa dos Coen”, ela constrói uma versão feminina de Llewelyn Moss com uma personagem machucada pela vida, mas com um humor sarcástico e um sorriso impenetrável. É maravilhoso vê-la em cena, com uma presença impressionante. Se ela não concorrer ao Oscar como Melhor Atriz, não há justiça no mundo. E se ela não ganhar… Bem, se ela não ganhar, a vencedora precisa ter um papel arrematador.

Além disso, o roteiro e a boa direção de McDonagh consegue mesclar todas as cenas em drama e comédia em doses iguais. O resultado é incrível: apesar de alguns exageros, como na cena envolvendo a personagem de McDormand, seu filho, seu ex-marido e a sua atual esposa, toda a história cria no espectador sentimentos múltiplos. Enquanto você gargalha, o coração fica apertado pelas situações que correm na tela. Mérito também da criação dos personagens, impecável.

A ambientação do filme também acerta em cheio, criando um faroeste moderno que fará parte do panteão deste gênero junto com Onde os Fracos Não Tem Vez e Bone Tomahawk. Afinal, além da cidade dar um clima interiorano perfeito, há uma trilha sonora grave, cheia de ondulações, que cria um clima de constante instabilidade. A paleta de cores, sempre em transição, cria sentimentos adversos no espectador, além da arenosidade natural oriunda das locações do filme.

Por último, a trama -- que poderia ser apenas mais um filme de vingança, ao estilo Old Boy e afins -- cria arcos de personagens incríveis. Ao invés de superar o ódio, dois personagens centrais apenas lidam com eles de diferentes maneiras. Não há a obviedade da redenção e do momento de iluminação. É uma história crua, direta ao ponto e sem grandes cuidados em ser correta. No final, isso deixa a sensação maravilhosa no espectador, que sai com a certeza de ter visto um dos melhores filmes do ano.

Agora, é esperar e torcer pelas indicações ao Oscar. Sem dúvidas, merece um espaço e alguns troféus.

* Visto em outubro de 2017, durante a cobertura especial da 41ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.

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