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Foto do escritorMatheus Mans

Crítica: 'Tempos de Barbárie' não consegue adaptar trama de vingança para o Brasil


Antes de tudo, vamos lá: não tem problema algum termos um filme sobre vingança no Brasil. É um tipo de história normal, que vemos aos montes em Hollywood, e que não há motivo para problematizarmos apenas por Tempos de Barbárie adaptar isso para a realidade brasileira. Ponto final. Quem diz o contrário (e há quem o diga, pode ter certeza) está inserindo na "síndrome do vira-lata". Agora, apesar disso, não dá para relativizar o que vemos no novo filme.


Estreia desta quinta-feira, 17 de agosto, o longa-metragem tem uma história simples: Carla (Cláudia Abreu) vê sua vida desmoronar quando um assalto dá errado e o bandido, preso no capô de seu carro, dispara um tiro. Não pega a protagonista da história, mas a filha -- que morre ali, sem chance de reação. A partir daí, Tempos de Barbárie entra em uma espiral de ação e vingança, com a personagem de Abreu fazendo de tudo pra se vingar e matar o algoz da garota.


De novo: não há surpresa alguma nisso. O longa do diretor Marcos Bernstein (de outros filmes bem mais leves, como o lindíssimo Meu Pé de Laranja Lima) reproduz tiques e clichês do cinema estadunidense, colocando essa personagem em uma explosão de adrenalina ao longo de todo o filme. A vemos correndo pra lá e pra cá, desafiando o marido e até a terapeuta (Júlia Lemmertz), e parece que o conforto está apenas na vingança, na violência. Enfim: Liam Neeson que o diga.


O problema está concentrado na mensagem dessa história. Bernstein -- que é um roteirista de mão cheia, mas que aqui derrapa feio -- não sabe bem como adaptar isso para a realidade brasileira. Quando temos filmes de vingança lá fora, é simples: colocam um estrangeiro, geralmente inimigo dos EUA, e o transformam em um bandido de marca maior. Torcemos pelo mocinho e pronto: um filme maniqueísta, sem muito o que dizer, e focado apenas na ação.

Em Tempos de Barbárie, enquanto isso, Bernstein faz de tudo para colocar esse tipo de história na realidade brasileira -- desde o tipo de assalto, passando pela forma que lidam com o crime e chegando, enfim, no ato final, que questiona o caminho da arma. Ainda que haja um certo questionamento torto, mas que funciona, o diretor e roteirista suga toda a esperança da narrativa. É um filme assumidamente pessimista, mas que indica apenas um único caminho.


Nessa visão de Bernstein sobre a sociedade brasileira, a vingança, na figura de uma mulher justiceira que faz as coisas com suas próprias mãos, é a saída -- qualquer outra coisa é se frustrar. Em tempos em que as armas de fogo são banalizadas, é um tipo de caminho perigoso a se seguir em um filme, que pode validar o pensamento de alguém em situação similar. O absurdo do final não basta para alguém, tomado pela raiva, perceber quão tosco é tudo aquilo.


Pior: quando Carla tenta se vingar de todos aqueles que contribuíram para aquela arma e aquela bala fabricarem a morte da filha, Bernstein comete outro erro crucial. Coloca o bandido que aperta o gatilho no mesmo patamar do cara que vende a arma. O filme não questiona, condena; o roteiro não instiga, determina. Novamente, um caminho perigoso. E mais: poderosos em um sistema ainda mais complexo, como já dizia em Tropa de Elite 2, ficam de fora. Seria isso justo?


Tempos de Barbárie derrapa em sua própria moral, sem saber exatamente como contar uma mensagem que parecia engasgada na garganta de Bernstein. O filme, em resumo, me lembra um pouco daquela derrapada que Liam Neeson deu há alguns anos, quando foi perguntando sobre vingança e disse um absurdo racista -- que obviamente não pegou nada bem. Bernstein não chega no mesmo nível, mas o filme parece um ódio represado e mal resolvido, assim como foi com Neeson. Não soube como lidar com tanta emoção e o resultado é esse: frio e distante.

 

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