A América Latina, nos anos 1970, foi atingida por uma cruel onda de ditaduras militares, fruto da Guerra Fria que preocupava os Estados Unidos e intensificava a ação e a força de governos comunistas, como Cuba e União Soviética. No Brasil foi a junta de generais que se alternou no poder entre 1964 e 1985. No Chile, Pinochet. E, no Uruguai, Juan María Bordaberry. E são nos efeitos deste último governo que se debruça o longa Uma Noite de 12 Anos.
Na trama, três rebeldes ao ditador são presos em solitárias e isolados de todo e qualquer tipo de comunicação. São eles: Eleuterio Fernández Huidobro (Alfonso Tort), Mauricio Rosencof (Chino Darín) e José 'Pepe' Mujica (Antonio de la Torre). O trio, sem muito didatismo por parte do roteiro, é praticamente feito de refém ao longo de 12 anos e impossibilidades de conversar, ver a luz do sol, se alimentar corretamente ou ir ao banheiro.
A partir daí, o diretor Álvaro Brechner (Sr. Kaplan) cria uma trama extremamente sensorial, emotiva e elegante, que não traz obviedade para seus acontecimentos, cenas e sequências. Há pouca -- ou quase nenhuma -- explicação sobre como aqueles três foram parar ali, além de uma série de flashbacks difusos e delirantes, além de pequenas amostrar do que cada um dos três fazia antes do aprisionamento covarde.
Mas, afinal, não é preciso mesmo falar os motivos daquela prisão. É simples: é um ditador de um lado, rebeldes do outro. A equação é simples. O que importante na trama, e que funciona muito bem, são efeitos desse confinamento forçado sobre as pessoas e as famílias. E, como já ressaltado, isso é feito de maneira onírica, extremamente sensorial, e sem cair na obviedade de outras tramas sobre ditaduras, como Pra Frente, Brasil!, A Cor do Seu Destino e Kamchatka -- bons, mas com tramas óbvias demais.
Um dos aspectos que eleva o filme está no próprio elenco. Além do emagrecimento assustador -- e da boa maquiagem, claro --, os três contam com interpretações fortes e emocionantes. Alfonso Tort (O Silêncio do Céu) é o mais carismático e o que mais chama a atenção. Consegue mesclar emoção com momentos mais leves, dando fluidez para a trama. Chino Darín (Primavera), filho de Ricardo, mostra como tem potencial no cinema. Ainda não chegou aos pés do progenitor, mas tem potencial dramático e emocional.
Antonio de la Torre (Volver), que faz o ex-presidente Mujica, é o mais prejudicado pelo roteiro, que acaba por incluí-lo de maneira um pouco torta. A dupla que convive, de fato, vários e vários dias no cativeiro é Rosencof e Eleuterio. O político, muito querido no Uruguai e na América Latina, parece estar ali apenas para engrandecer o filme para os outros públicos. Fica um pouco fora de mão. Ainda assim, La Torre tem uma cena extremamente emotiva com Mirella Pascual, intérprete da mãe de Mujica. É uma cena forte, intensa, arrebatadora e que prepara o público para o final de emoção crescente.
A conclusão, então, ganha pontos por sua necessária amostra do mal que ditaduras fazem por aí -- o Brasil parece sempre estar à beira de uma -- e por uma força, que parecia escondida até então. Álvaro Brechner une os talentos ímpares dos protagonistas com uma trilha sonora marcante (The Sound of SIlence, lindamente interpretada) e uma contextualização que amplia a história e seus significados. O filme termina numa nota alta. Sensível, emocional, forte, impactante, urgente. Merece ser visto e apreciado.
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