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Foto do escritorMatheus Mans

Crítica: 'The Royal Hotel' demora demais a chegar em seu ponto nevrálgico


Arrisco dizer que Kitty Green está se mostrando como um dos grandes nomes dessa nova geração de cineastas. É dela o filme A Assistente, um dos grandes da safra 2019/2020, além de ter dirigido o interessante documentário Quem é JonBenet. Agora, Green chega na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo com o aguardadíssimo The Royal Hotel, ainda sem data.


Assim como seus outros filmes, Green fala sobre a violência contra a mulher, assim como o papel feminino na sociedade. A trama gira em torno de de Hanna (Julia Garner) e Liv (Jessica Henwick), duas amigas viajando pela Austrália e que, para juntar algum dinheiro, aceitam trabalhar em um pub de uma cidade mineradora. Só que as coisas não saem como o esperado.


Dos 91 minutos de The Royal Hotel, Green leva 70 deles, no mínimo, cozinhando a trama. Mostrando como é a relação dessas duas amigas, como é esse mundo em que estão inseridas e, principalmente, como é a reação das duas frente ao machismo que surge em uma piada, em uma reação, em um olhar e por aí vai. Cria-se o ambiente, preparando para o que vem depois.


As boas atuações de Garner (também de The Assistant) e de Henwick (Glass Onion) ajudam a construir essa ambientação. São duas personagens completamente distintas em termos de olhar e comportamento, indicando que, talvez, elas tenham vivido coisas bem distintas do que viveram no passado -- um delas é bem mais ressabiada do que a outra, mais atenta, curiosa.

Além disso, os homens do filme -- que nunca são santos, sequer bonzinhos -- também ajudam a criar o clima de ameaça que pairam essas duas amigas, no interior australiano. Destaque para James Frecheville (Reino Animal) e Toby Wallace (Dente de Leite), que entregam as atuações mais consistentes do longa-metragem. Afinal, conseguem transitar entre humores facilmente.


O grande problema do filme, e que não o eleva para a grandiosidade de The Assistant, reside no final. Depois de preparar o terreno por tanto tempo, a explosão chega rapidamente, em uma sequência que também se arrasta. Obviamente causa certo desespero, acredito que principalmente para o público feminino, mas não chega a recompensar os outros 70 minutos.


Falta complexidade, ainda que a essência da mensagem de Green esteja ali: que não dá para confiar em homens. Dos mais serenos aos mais explosivos, dos estranhos aos mais normais. Há uma cultura de violência contra a mulher, que é vista como recurso -- algo que outro filme da Mostra, Irmandade da Sauna a Vapor, trata tão bem. E assim o filme tem algo a falar.


Também é interessante notar como The Royal Hotel sabe como lidar com o humor. O machismo chega entre risinhos abafados, duplo sentido e aquela cumplicidade masculina de sempre.


No final, The Royal Hotel mostra quem tem o que dizer: é um comentário sobre o machismo inerente ao homem, que surge em maior ou menor medida, sempre entendendo a mulher como posse. Uma pena, porém, que o filme não tenha a força e a explosão de The Assistant, ficando mais contido tanto em sua ambientação quanto no final. Faltou força. Mas ainda assim é bom.

 

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