Pode-se dizer, com relativa tranquilidade, que Dominga Sotomayor Castillo é uma das cineastas mais interessantes no cenário cinematográfico hoje, aqui na América Latina. Com direção segura, que sabe como compôr ideias e sentimentos, a diretora chilena mostrou um tino maduro para o cinema em 2012, com o lindo De Jueves a Domingo, sobre família, infância e separação.
Agora, ela volta a visitar o tema familiar com o indeciso Tarde para Morrer Jovem, estreia dos cinemas desta quinta-feira, 27. Dirigido e roteirizado por Sotomayor, o longa-metragem acompanha a história de uma comunidade que, após o fim da ditadura no Chile, decide viver de modo libertário no sopé dos alpes chilenos. Uma vida de regras próprias, sem amarras.
Nessa trama, Dominga decide colocar sua lente sobre a vida de Sofia (Demian Hernández), Clara (Magdalena Tótoro) e Lucas (Antar Machado), três jovens/pré-adolescentes que vivem seus próprios dramas, amores e descobertas enquanto preparam a festa de Ano Novo da comunidade em que vivem. São histórias adolescentes e infantis, com aqueles sabores próprios das idades.
E Dominga sabe contar essas tramas como ninguém. Na primeira metade do filme, salta aos olhos a habilidade da diretora chilena em estabelecer a personalidade de cada um dos personagens e quais são os dilemas que enfrentam. Não há julgamento sobre o que vivem, e tampouco a diretora quer tratá-los como coitados. É uma história de pura observação.
E isso tem seu lado ruim também. Se afastando demais da história, Tarde para Morrer Jovem foge de didatismos de forma exagerada. Não há contexto de que época é, onde se passa, a situação daquelas pessoas. Tudo, em tese, precisa ser adivinhado pelos espectadores. Didatismo demais nunca é bom. Mas a falta de um tom mais explicativo pode pôr o filme a perder.
O fato, porém, é que a diretora filma a tal comunidade de maneira brilhante. Seus enquadramentos são pensados para trazer movimento, enquanto mostram a riqueza daquele lugar. Num primeiro plano, crianças brincam. Atrás, jovens conversam. No fundo, adultos trabalham. Tudo ali é milimetricamente pensado e Domingas apresenta direção consistente.
O elenco também é conduzido com mão firme de Dominga. Demian, Antar e Magdalena são atores de primeira viagem que conseguem encontrar rapidamente o tom de seus personagens. Principalmente a intérprete de Sofia, que mais tem material em cena e uma possibilidade de arco dramático mais claro. São atores que convencem e passam uma interessante realidade.
No entanto, apesar da direção espetacular de Dominga -- e que mereceu o prêmio em Locarno -- há um fratura exposta ao longo de toda a projeção: o roteiro. Por mais que haja um trabalho interessante de estabelecimento dos personagens na primeira metade, a sensação é de que o roteiro esquece de desenvolver as situações, as relações. Tudo fica num marasmo cansativo.
Tudo bem que o filme prega uma liberdade de forma e conteúdo que espelha a situação de seus personagens. Mas é preciso ter algum plot, alguma situação que enriqueça a narrativa e faça valer as quase duas horas de rodagem. Da maneira que ficou, há até certa poesia no olhar e na belíssima fotografia Inti Briones (Hebe). Mas o vazio narrativo acaba tomando conta, no final.
O fato é que Tarde para Morrer Jovem tinha mais potencial do que apresenta. A direção espetacular de Dominga, a fotografia primorosa, os bons atores e a boa temática não são o bastante para esconder um roteiro com fragilidades e que peca em desenvolvimento. Não é um filme ruim. Mas pode despertar, no final das contas, mais cansaço do que admiração e brilho.
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