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Foto do escritorMatheus Mans

Crítica: 'Sócrates' é filme forte e provocativo


Na lista de selecionados do Brasil ao Oscar, três se destacaram: Bacurau, Sócrates e A Vida Invisível de Eurídice Gusmão. Como já sabemos, este último foi o escolhido para, enfim, representar o País. No entanto, não dá pra ignorar os outros dois bons destaques. Bacurau fez uma bonita carreira nos cinemas do Brasil -- e o elogiamos aqui no Esquina. Sócrates, enquanto isso, chega agora de maneira silenciosa, quase nas sombras. Mas a história merece destaque. É intensa, forte, provocativa e bem brasileira.

Dirigido por Alexandre Moratto, que estreia no comando de longas documentais, Sócrates acompanha alguns dias na vida do garoto que dá nome ao filme. O rapaz, vivido pelo talentoso Christian Malheiros (da série Sintonia), acorda um dia e encontra a mãe morta na cama. Menor de idade, ele precisará se virar como pode para sobreviver na periferia de Santos, no litoral de São Paulo. Mas sem emprego, sem familiares próximos e sem ter um teto pra morar, será um desafio e tanto pro rapaz.

O filme é curto, tem só 71 minutos -- está mais para um média-metragem, afinal das contas. Mas é o bastante para fazer um mergulho total na vida desse menino que passa por uma intensa transformação. O roteiro, escrito por Moratto e pela estreante Thayná Mantesso, não perde tempo com coisas desnecessárias. Ele foca em mostrar esses dias complicados na vida de Sócrates. Nem um pouco a mais, nem um pouco a menos. Há uma reverência ao personagem, no sentido do filme não querer incomodá-lo demais.

Isso funciona, principalmente, por conta da figura de Malheiros. Ele entende o personagem e, sob a batuta de Moratto, sabe como conduzi-lo. Os sentimentos surgem no olhar, no arquear das sobrancelhas, na tristeza de alguns gestos. A falta de chão para Sócrates acaba passando ao espectador ao longo da projeção, que em determinado momento começa a se tornar torturante por conta das experiências vividas pelo protagonista. A empatia acontece e a vontade é levantar, entrar na tela e ajudá-lo.

Há uma clara deficiência orçamentária no longa-metragem, que abusa de recursos que o barateiam. Infelizmente, alguns ficam evidentes na tela e reduzem a experiência, como alguns coadjuvantes bem despreparados, algumas recorrências de locações e uma falta de cuidado aqui e ali. Além disso, em determinado momento, parece que a questão da homossexualidade do personagem acontece rápida demais. Tudo bem que isso faz parte de algo maior. Bem maior. No entanto, poderia ter sido bem mais e melhor explorada.

Mas, e aqui é um convite, é melhor entender meandros do filme que não estão na tela. A interpretação de Malheiros, por exemplo, diz muito mais do que seus diálogos. Pequenas histórias, aparentemente sem importância, engrandecem a trama. E pense, leitor, nos motivos por trás do nome Sócrates -- e que vai além do jogador do Corinthians. O pensador grego achava que as pessoas precisavam se voltar para o interior de si próprias. Só assim para encontrar o bem. E qual o processo visto no filme? Pois é.

Sócrates é um filme curto, visivelmente barato, mas que acaba sendo muito maior do que aparenta. A força de sua mensagem, e das interpretações e do roteiro, acabam colocando o longa-metragem em outro patamar. Mereceu dividir as atenções com Bacurau e A Vida Invisível de Eurídice Gusmão, por mais que esteja um pequeno degrau abaixo. É um filme que, hoje, precisa ser visto, comentado. Fala sobre o Brasil. E, afinal das contas, é o que mais precisamos pensar e falar hoje em dia. Sobre nosso País.

 

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