É irônico, mas algo que vem martelando na minha cabeça desde que assisti a Sociedade do Medo é como essa produção, dirigida por Adriana L. Dutra, é medrosa. O longa-metragem, que chega aos cinemas nesta quinta-feira, 20, tem uma proposta bem simples: explicar o que é o tal do medo e como ele, principalmente, se tornou um instrumento eficaz de poder na sociedade.
A partir disso, dá para falar sobre muitas coisas e, acima de tudo, ir da reflexão para a prática. Da ideia para a ação. Afinal, depois desfilar alguns dos maiores pensadores na frente de sua câmera, Adriana tinha espaço para mostrar com profundidade como isso está se entranhando na vida cotidiana de hoje. Do agora. Mas não é isso que acontece: o filme, do nada, se acovarda.
Sociedade do Medo, por exemplo, nunca cita diretamente a sociedade do medo de Jair Bolsonaro -- oras, tem algum ícone brasileiro que trabalhe mais com o medo do que ele? Parece que a cineasta não aceita que é preciso ir além e prefere, sem muita razão de ser, ficar só na teoria. É cansativo, quase uma aula na faculdade. A profundidade, tão prometida, nunca chega na tela.
Pode até ser uma tentativa de fazer com que o filme não fique velho ou evitar dar nome ao inimigo -- sem falar de políticos tão perigosos, seus nomes e ideias morrem mais cedo. Mas isso acaba sendo contraproducente. O documentário, evitando essa temporalização, dificulta a reflexão e acaba tornando tudo mais etéreo. Apesar de exemplos recentes, não há sua origem.
Pior: Adriana também não afina a linguagem, fazendo com que Sociedade do Medo seja uma produção refém daquele formato tão convencional de documentários para televisão. Especialistas falam ao longo de vários minutos, aparecem imagens de arquivo, os especialistas voltam. É cansativo e mostra como a profundidade é apenas prometida, nunca alcançada.
Enfim: Sociedade do Medo até tem seus méritos, refletindo sobre um assunto que poucas vezes é tão destrinchado e pensado. Mas fica a tristeza e o pensamento de que é um documentário que poderia ir além. Ser mais aguerrido, mais profundo, mais intenso. Há boas intenções, e isso é muito claro. Só que fica a sensação de que é uma boa intenção que, uma pena, morre na praia.
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