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Foto do escritorMatheus Mans

Crítica: 'Samuel e a Luz' é bonito conto documental do Brasil profundo


Ainda que isso pareça muito distante para quem vive nas grandes cidades, há brasileiros que vivem no escuro. Levantamento do Ministério de Minas e Energia indica que quase 0,1% dos brasileiros vivem sem energia elétrica -- são mais de 200 mil pessoas. Uma dessas pessoas era Samuel, o garotinho de uma pequena vila em Paraty e que aparece no potente documentário Samuel e a Luz. O filme responde uma pergunta importante: como a luz pode mudar a rotina?


Seleção da Mostra 2023, o longa-metragem é basicamente dividido em dois grandes atos. No começo, o diretor e roteirista Vinícius Girnys mostra as famílias -- em especial a de Samuel -- enquanto Ponta Negra está começando a receber energia elétrica. A concessionária está instalando os primeiros postes no local e, depois de décadas, levando esperança para essas pessoas. É um primeiro vislumbre de como é a vida dessas pessoas só com velas e lanternas.


Depois, em um segundo ato, Girnys observa e relata como é essa vida depois que a energia elétrica chega à Ponta Negra -- colocando o pequeno Samuel no meio dessa transformação. Ainda que tenha um ar poético, principalmente carregado pela fotografia mais do que inteligente de Pedro Cortese, que sabe trabalhar com luzes e sombras, Samuel e a Luz está interessado em mostrar fatos: como a vida dessas pessoas se transforma com a energia? O que muda, enfim?

A câmera do cineasta capta mudanças. A tela ganha espaço. Onde antes havia conversas e silêncios, há mudança de comportamento. Além disso, geladeiras começam a chegar, novos espaços começam a surgir, comércios a existir. É uma mudança não só em apertar um interruptor, mas também na forma que essas pessoas enxergam o mundo. Samuel, enquanto isso, parece resistir. Brinca silencioso, monta brinquedos. Resistência ou falta de inclusão?


Há, ainda, todas as questões que afetam a realidade brasileira. O comício de vereadores e afins, quando a luz chega, é emblemático -- a pessoa no microfone se confunde, inclusive, com o nome da região. Depois, há toda a questão envolvendo o turismo e a nova dependência dos moradores.


A poesia chega através do incômodo. Nos pegamos questionando se aquela luz foi realmente benéfico para aquelas pessoas -- e será que não há algo mais injusto e elitista do que pensar isso? Além disso, a transformação não tem mais como parar. Não pode mais parar, enfim.


Samuel e a Luz, assim, se revela como um filme que, a partir do microcosmos dessa pequena vila de Paraty, consegue revelar como nossos comportamentos mudaram com a chegada da luz elétrica. Padrões, comportamentos, relacionamentos. Tudo muda. E aí fica a pergunta: como Samuel, que nasceu sem luz e agora vai crescer iluminado, será impactado com isso? O filme, é claro, não consegue responder isso prontamente. Mas nos faz olhar para nossos mesmos.

 

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