Retablo é o nome de um ornamento, quase sagrado, que permeia a cultura peruana. Feito de maneira artesanal, com massa de batata, ele serve como um registro familiar, um santuário, uma caixa de recordações. É delicado, colorido, envolvente. E esses também são os adjetivos certos para resumir o drama peruano Retablo, indicado do País ao Oscar de 2020 e que chega às salas de cinema brasileiros nesta quinta-feira, 7.
Dirigido por Alvaro Delgado Aparicio, estreante em longas, Retablo conta a história de uma família que passa por um momento delicado. O jovem Segundo (Junior Bejar) ama a vida que leva, como ajudante de seu pai -- um famoso e querido artesão da região, chamado Noé (Amiel Cayo), que confecciona os tais retablos. No entanto, num dia como outro qualquer, Segundo acaba presenciando algo que quebra a magia ao redor do pai.
A partir disso, Delgado Aparicio constrói uma trama familiar que emociona, entristece, comove. Retablo, assim como o ornamento que o nomeia, é um filme que registra um momento dessa família, eternizando-o -- no entanto, nada de cores, alegria ou figuras felizes. Os tons são escuros, as cores são ocres. Não há felicidade na vida de Segundo após a tal descoberta. As coisas desandam e ele sabe que o futuro não será feliz.
O roteiro, do cineasta e de Héctor Gálvez (NN), não tem pressa em contar a história. Por mais que tenha apenas 95 minutos, o longa-metragem faz tudo com calma, em detalhes. Lembra um pouco o belíssimo Las Acácias na forma de conduzir a história -- ainda que ambas as tramas não tenham nada em comum. Há um foco nos olhares, nos gestos, na beleza de construir o retablo. Delgado Aparicio é um diretor pra ficar de olho.
Ainda mais por conta de alguns bem sacados planos de enquadramento. A câmera, por vezes, se torna o ornamento artesanal sendo construído. Em outras, mostra detalhes, enfatiza dramas humanos. É esperta e natural. Ajuda a entrar melhor na narrativa.
Junior Bejar, também estreante, não tem muitos artifícios interpretativos -- geralmente, se contenta com uma ou duas expressões. Acaba tirando alguns pontos, mesmo crescendo em intensidade no final. Já Amiel Cayo e Magaly Solier, os intérpretes dos pais do menino, acertam em cheio. Sabem transitar entre emoções, mesmo que sejam contidas, e emocionam na tela -- uma cena com Magaly é de apertar o coração.
Mas, apesar disso tudo, o grande ponto de Retablo é a reflexão que deixa no final. As sociedade como um todo, a força de relações de amizade e até mesmo a metáfora do próprio retablo. Tudo isso contribui para ampliar e intensificar o que há por trás desse delicado longa-metragem peruano. Reflexão, boa história, bons personagens. É um filme para assistir e torcer, caso avance na corrida do Oscar. Qualidade há suficientemente.
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