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Foto do escritorMatheus Mans

Crítica: 'Paraíso Perdido' se perde em exageros, ainda que agrade


Ultimamente, o mercado de séries para a TV se mostra cada vez mais saturado. Além da extensão exagerada de algumas produções, como 13 Reasons Why e La Casa de Papel, muitas mostram que se resolveriam com um único filme de duas horas -- como Glow, 3% e, em alguns pontos, Altered Carbon. O novo longa nacional Paraíso Perdido, porém, vai na direção contrária e mostra que seria muito mais eficiente como série do que filme.

A trama se passa quase que inteiramente na casa noturna Paraíso Perdido, em São Paulo. Comandada pelo patriarca José (Erasmo Carlos), a boate é uma concentração de sua família e de músicas românticas brasileiras -- o bom e velho brega. Lá também estão o filho Ângelo (Júlio Andrade), os netos Imã (Jaloo) -- transformista defendido por Odair (Lee Taylor) -- e Celeste (Julia Konrad) e os amigos Taylor (Seu Jorge) e Pedro (Humberto Carrão).

A partir desse núcleo familiar, então, a diretora e roteirista Monique Gardenberg (de Ó Pai, Ó) tece uma história complexa envolvendo, praticamente, todos integrantes familiares, interesses amorosos, funcionários e outras pessoas da árvore genealógica de José que vão surgindo -- como a outra filha Eva (Hermila Guedes). Tudo isso embalado por música de primeiríssima qualidade (Odair José, José Augusto, Márcio Greyck, Roberto Carlos, Raul Seixas) e tons enevoados que remetem ao neon da cidade e da noite paulista.

Nessa trama genealógica, Gardenberg quer falar sobre tudo, mas acaba falando sobre nada. Tentando abraçar temas como amor, sexualidade, intolerância, aborto, câncer e família, no final tudo fica muito corrido, artificial. Ainda que algumas temáticas recebam mais atenção do que outras, o roteiro deixa as ligações entre as histórias frágeis demais. Há viradas de trama que não convencem, outras que são perdidas no mar de histórias.

Além disso, Gardenberg opta por colocar o personagem Odair -- policial que se envolve num romance complicado enquanto protege Imã de agressões nas ruas -- como o ser que liga tudo e todos em Paraíso Perdido. Até funcionaria se o personagem tivesse um pouco mais de camadas e, sobretudo, se Lee Taylor fosse um pouco melhor. Afinal, o ator de O Mecanismo e Velho Chico se mostra muito limitado em alguns momentos, sem a emoção necessária.

Ainda bem, porém, que Taylor é um ponto fora da curva nesse sentido. O elenco é o ponto alto. Erasmo Carlos, Humberto Carrão e Julio Andrade são subaproveitados, mas Marjorie Estiano, Seu Jorge e Julia Konrad cumprem bem os seus papéis e chamam a atenção. Mas o brilho fica mesmo com Jaloo, Malu Galli e Hermila Guedes. Que trio! Roubam a atenção quando aparecem e ofuscam qualquer um em cena. Jaloo, aliás, precisa de mais papéis para o cinema e a TV. Tem uma veia dramática fortíssima e interessante.

No entanto, essas boas atuações -- somadas à excelente seleção musical de Zeca Baleiro -- se perdem nesse ritmo entrecortado e pouco uniforme da produção. Pontos positivos ficam à margem num filme que tinha tudo para ser uma série grandiosa, bem dosada, real, brasileira. Afinal, com mais tempo em tela, os personagens teriam mais espaço para se desenvolver e a história, de crescer. Até a reviravolta final, mesmo interessante, perde força num roteiro que tenta priorizar todos, mas não cumpre seu papel primordial.

Paraíso Perdido tem uma boa premissa, um elenco excepcional, uma seleção musical de ponta e um design de produção coerente e de encher os olhos. Os excessos do roteiro de Gardenberg, porém, tiram o brilho da narrativa e a deixa fosca, sem vida, corrida, apressada. Que sonho se esse longa-metragem virasse uma série. Nas mãos certas e com investimento, daria um novo clássico da televisão brasileira. Não há dúvidas. Se fosse série, ganharia uma cotação excelente. Como filme, porém, não sai do bom -- e olhe lá.

 
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