Já diriam os minimalistas: "menos é mais". Isso é um bom ensinamento não apenas para a organização do dia a dia, como também para certas representações: a gastronomia, o teatro e, é claro, o cinema. Ainda que algumas obras dantescas da sétima arte acertem em cheio, como O Senhor dos Anéis e Star Wars, sempre há algo de simplicidade por trás. A busca, a história, os personagens, a forma como aquilo é contado. E é justamente aí que está o erro de Oxigênio.
Produção original da Netflix, o longa-metragem é claramente "filhote da pandemia". Afinal, ainda que haja uma explicação na própria lógica do filme, Oxigênio conta com cenário reduzido e, quando os flashbacks exigem um maior número de pessoas em cena, as vemos com máscaras ou proteções típicas da pandemia do novo coronavírus. E a ideia desse ambiente controlado, que fica restrito quase a apenas um único cenário, é uma boa sacada do cineasta Alexandre Aja.
Ele, que ficou conhecido recentemente pelo bom Predadores Assassinos, agora volta para a França, sua terra natal. A trama, porém, flerta com a ficção científica americana ao acompanhar a história de Elizabeth (Mélanie Laurent), uma mulher que acordou do nada em uma câmara criogênica -- aquelas que colocam as pessoas para dormir e já foi alvo de polêmica em Passageiros. No entanto, ela não lembra quem é e o oxigênio, aos poucos, vai acabando por ali.
Ela precisa, de qualquer forma, entender como foi parar ali e, principalmente, como escapar da situação. A partir daí, Aja vai brincando com o roteiro da estreante Christie LeBlanc para mostrar o desespero dessa situação e a necessidade que surge a partir do escapismo. É um filme com boas ideias, com um começo realmente desesperador, e que crescendo em intensidade. Muito por conta da atuação certeira de Laurent (Bastardos Inglórios), que cai como uma luva no papel.
Além disso, Mathieu Amalric (O Escafandro e a Borboleta, O Grande Hotel Budapeste) também se sai bem no trabalho de voz de M.I.L.O, lembrando outros trabalhos similares de qualidade, como Scarlett Johansson em Ela. Há um tom de perigo eminente na inteligência artificial, assim como um ar de segundas intenções. Tudo isso também é bem complementado pelo visual adotado pelo designer de produção Jean Rabasse. Ele acerta em cheio na criação dessa atmosfera dúbia.
O grande problema de Oxigênio, assim, está na sua segunda metade. Ainda que Aja se esforce para manter a coerência na trama, o roteiro de LeBlanc peca, como já falamos, pelo excesso. Pense em pautas da ficção científica dos últimos dez anos nos cinemas. Pode ser uns cinco temas. Pensou? Muito bem. Apostou com você, caro leitor, que pelo menos cinco delas estão na história dessa ficção científica. Não vou falar aqui pra não entregar spoilers, mas é um exagero.
A sensação que fica é que a roteirista apostou em uma série de temáticas populares para ir incrementando um roteiro que poderia ser resolvido com uma boa direção e criação de atmosfera. A excelente premissa de uma pessoa presa em uma cápsula de criogenia vai se transformando, se adaptando, se expandindo. No final, isso é só uma lembrança de algo que, pena, vira uma espécie de monstro amorfo. Faltou mais foco em resolver apenas a ideia inicial.
Oxigênio, vale dizer, não é um filme ruim. Pelo contrário. A boa atuação de Laurent, o trabalho de voz marcante de Almeric e a boa direção de Aja ajudam o longa-metragem a ser um daqueles bons filmes que nos surpreendem na Netflix -- inclusive com ecos da pandemia que vivemos nos dias de hoje. Mas é uma pena que o longa-metragem não tenha apostado na simplicidade pra empolgar e atrair o público. Tinha potencial. Uma pena os realizadores não terem visto isso.
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