Muitos filmes já estragaram seus finais por conta de reviravoltas completamente sem sentido. Já outros erraram ao quebrar expectativas. Mas nenhum filme, pelo que puxo da memória, finalizou uma história sem conclusão. E não falo de finais abertos, não: falo de um filme que, de maneira totalmente anticlimática, sobe os créditos do nada, sem concluir a linha de raciocínio.
O longa-metragem em questão é Os Órfãos, estreia desta quinta-feira, 30. Adaptação do ótimo romance A Volta do Parafuso, de Henry James, o filme conta a história de Kate Mandell (Mackenzie Davis), uma professora que decide largar seu emprego para ser a tutora de uma garota órfã (Brooklynn Prince) que vive com irmão (Finn Wolfhard) e governanta numa mansão.
Lá, ao contrário do que esperava, ela se depara com o horror: uma família dilacerada pela morte, abusos que foram cometidos nas quatro paredes e duas crianças infelizes, sem vida.
Aqui, a diretora Floria Sigismondi, que tem larga experiência em videoclipes e em séries, opta por pegar essa premissa e explorar as possibilidades de uma casa mal-assombrada -- ao contrário do livro e da primeira adaptação, que seguem por um caminho de terror social. Assim, protagonista vive um pesadelo, onde vê fantasmas no espelho, gritos na noite e vultos no ar.
Os sustos não são inspirados -- claramente falta experiência para Sigismondi, que aposta em obviedades -- e tudo anda num único tom. A sensação é que o roteiro dá voltas ao redor de si mesmo, sem saber onde se encontrar. Não é à toa que a primeira mudança de prumo acontece com quase uma hora de duração, quando as assombrações ficam perigosas e realistas.
No entanto, apesar da falta de tom, não é um suspense ruim. Davis (O Exterminador do Futuro: Destino Sombrio) e Prince (Projeto Flórida) estão bem e souberam entrar nas suas personagens. O terror que elas passam quebram a barreira da tela e cai no colo do espectador. Grupos de adolescentes nos cinemas, sem dúvidas, vão rir, se divertir, levar bons sustos no escuro da sala.
Só Wolfhard (It: A Coisa) que está fora de tom, por culpa do roteiro de Carey W. Hayes e Chad Hayes (ambos de Invocação do Mal). Não há desenvolvimento de seu personagem, chato e raso.
Agora, tudo vai por água abaixo -- e Os Órfãos deixa de ser um filme minimamente aceitável -- nos cinco minutos finais. Sigismondi aposta numa série de finais alternativos colados, sem nenhum tipo de explicação plausível, e termina o longa no meio do seu raciocínio para aquela conclusão. É absolutamente bizarro: a história simplesmente é cortada e os créditos sobem.
Pense na seguinte situação: você está numa mesa de bar, conversando animadamente com um amigo. A conversa está rolando solta. Tem alguns problemas, algumas pausas, mas parece que aquela prosa toda vai se encaminhar para uma boa discussão final. A apoteose, o clímax. Mas aí seu amigo decide levantar no meio da conversa e ir embora, sem mais nem menos. Acaba tudo.
É exatamente esse o sentimento com Os Órfãos. Por mais que a "conversa" ao longo do filme não estivesse 100% alinhada, era algo que dava pra levar. No entanto, não dá pra aceitar uma história que corte seu clímax no meio, sem mais nem menos, e decida subir os créditos -- não é à toa que a sessão para a imprensa continuou lotada até o fim, aguardando uma conclusão.
Em resumo, Os Órfãos é um filme que poderia ser muito mais divertido e interessante se a diretora Floria Sigismondi não decidisse levar a história tão a sério. Por outro lado, poderia ser um filme interessante sobre tensão social se não tivesse tantas obviedades. Ou seja: a trama caiu, justamente, no vórtex de caos e bizarrice. Difícil levar a sério um trabalho como esse aqui.
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