Quando vi que Ninguém Precisa Acreditar em Mim, livro fundamental do trabalho do mexicano Juan Pablo Villalobos, seria adaptado para os cinemas, fiquei pensativo. O texto da obra do escritor é complexo, cheio de metalinguagens, em que ele se coloca dentro de uma história -- enquanto produz o texto que estamos lendo. Como isso vai achar o tom ideal nas telonas?
O resultado pode ser visto no longa-metragem que estreia nesta quarta-feira, 22 de novembro, no catálogo da Netflix. Dirigido por outra figura mexicana talentosa, Fernando Frias (do ótimo Ya No Estoy Aquí), o longa-metragem acompanha a história de Juan (Dario Yazbek Bernal), esse jovem escritor que está indo pra Barcelona para estudar em um doutorado na cidade espanhola.
Só que logo as coisas saem do controle. O motivo? Ele é cooptado por criminosos, que matam seu primo para mostrar como as coisas são sérias, que exigem que ele siga uma série de demandas absurdas e que não fazem sentido -- como levar sua namorada junto para Barcelona e, depois, conquistar uma garota feminista de uma outra sala de doutorado em sua faculdade.
O filme todo, a partir dessa premissa, é povoado por um humor absurdo. As coisas vão se sucedendo sem muita explicação, deixando o público exageradamente no escuro -- a gente não consegue compreender bem o que está acontecendo até os 20 minutos finais. É um teatro do absurdo, com Juan perdido no meio desse tiroteio de absurdos, gangues e crimes na Espanha.
Essa confusão do roteiro, assinado por Frias e por Maria Camila Arias, acaba se contrabalancendo com uma direção criativa. O formato quadrado da tela ajuda a dar a sensação do cerco se fechando ao redor do personagem, enquanto a criação visual da vida daquelas pessoas dá o tom de uma Barcelona que não vemos nas fotografias tiradas por turistas.
Há um comentário pungente aqui, e interessante, sobre a situação do imigrante (principalmente o latino) dentro da Europa, sempre cerca de desconfiança e de aproveitadores -- que até podem se passar como amigos, tal qual o italiano próximo de Vale (Natalia Solián). São nesses breves comentários que o filme consegue, junto com a boa direção, mostrar o seu valor narrativo.
Uma pena que o filme seja tão frustrante. Deixando esses comentários pra lá, Frias decide abraçar a intriga política da Espanha em uma conclusão apática, banal e sem vida. A atuação fraca de Bernal (irmão de Gael) ajuda a prejudicar o todo, já que seu personagem nunca encontra seu próprio coração, ficando apenas confuso andando de lá pra cá o tempo todo.
Para mim, que já li o livro de Villalobos, fica a sensação de que essa confusão, esse mistério em torno da narrativa, que se revela lá no terço final, prejudica imensamente Ninguém Precisa Acreditar em Mim. Cria-se uma sensação de que o filme irá concluir com esse comentário que faz tanto sentido, mas, no final, é só mais uma trama política criminal sem vida da Europa.
Se isso estivesse presente nos minutos iniciais, um pouco do humor iria se perder, mas o drama iria ganhar pungência, ainda mais com todo esse contexto de imigrantes latinos. Faltou um maior cuidado com o roteiro, que quis ser esperto demais e acabou prejudicando a história.