Flávio Migliaccio, infelizmente morto em 2020, foi um dos atores mais versáteis que o cinema e a televisão no Brasil já teve. Transitava entre os mais diferentes personagens: desde o árabe genérico das novelas, passando pelo Tio Maneco, atravessando a época das pornochanchadas e até chegar em produções como Terra em Transe. Um ator completo, como poucos resistem.
Por isso é tão importante uma produção como Migliaccio: O Brasileiro em Cena. Dirigido a seis mãos por Tuco, Alexandre Rocha e Marcelo Pedrazzi, o longa-metragem é uma espécie de conversa, de bate-papo dos realizadores com Migliaccio. Seja por entrevistas feitas pelo trio ou com imagens de arquivo, acessamos o mais íntimo de Migliaccio que conseguimos avançar.
Há falas, posicionamentos e diálogos do ator sobre a morte, Deus, religião, medos, receios, cansaços. Entendemos mais dessa figura tão presente no imaginário cultural brasileiro, com personagens igualmente marcantes. Aliás, mais do que uma cinebiografia ou algo do tipo, Migliaccio é mais uma celebração do ator. Um viva à memória de Flávio e à sua carreira.
É interessante, também, como a própria edição do filme tem algo a dizer. Não é banal, sem propósito. O longa-metragem intercala falas de Migliaccio com cenas no cinema e na televisão que fazem sentido para o que foi dito um pouco antes -- ou para algo que vai ser contextualizado logo depois. É algo infelizmente raro de se ver em documentários assim. Enriquece o material.
No entanto, não dá pra dizer que o filme é realmente ousado e criativo, como um Todos os Paulos do Mundo ou Histórias que nosso cinema (não) contava. Parece que os realizadores vislumbraram essa possibilidade, mas resolveram jogar no seguro. Migliaccio, dada a potência de seu biografado, poderia ter ido além desse jogo de arquivo-entrevista-arquivo. Uma pena.
Mas isso, de maneira alguma, tira o brilho desse personagem. Ele continua profundo, interessante, necessário. Perdemos Migliaccio de maneira brutal, triste. É importante, assim, termos um complemento à sua história, neste caso no formato de documentário, para que o trabalho de Migliaccio tenha ainda mais contexto, histórias e profundidade para lembrarmos.
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