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Foto do escritorMatheus Mans

Crítica: 'Meu Tio e o Joelho de Porco' faz resgate da cena punk paulistana


Lá pelos idos dos anos 1970, uma banda na cidade de São Paulo foi na contramão de tudo que estava acontecendo na cena musical brasileira. Ainda que houvesse muito experimentalismo e novos ritmos insurgindo, a Joelho de Porco trouxe o punk para o coração da cidade e o rock cômico ganhou força -- como, depois, veio a influenciar Mamonas Assassinas, Premê e por aí vai. É uma banda que fez história, mas perdida na memória.

Agora, o cineasta Rafael Terpins (do bom curta A Guerra dos Gibis) comanda o longa-metragem Meu Tio e o Joelho de Porco, no qual conta a trajetória de seu tio, Tico Terpins, líder do grupo de punk rock. Pouco usual, o documentário mescla linguagens e narrativas, compondo uma teia de situações e memória que trazem a figura do músico de volta. São imagens de arquivo, entrevistas, relatos pessoais do diretor e até uma animação.

Essa dinamicidade de formatos, formas e linguagens ajuda a contar a história na tela grande e a exponenciar a força do Joelho do Porco. A maioria das entrevistas, por exemplo, são de pessoas intimamente ligadas ao passado do grupo e, principalmente, à história de Tico. É divertido ouvir alguns "causos" sendo contados, como as pegadinhas com amigos ou noites homéricas de bebedeira, onde garrafas de conhaque eram entornadas.

A direção de Terpins segue a qualidade de seu curta-metragem anterior e chama a atenção por dois motivos: as boas composições de quadro e a naturalidade das situações. Sobre o primeiro motivo, fica claro como cada cena é bem pensada e como cada locação é acertada. O centro de São Paulo e a borda da pista do Aeroporto de Congonhas não estão lá à toa, criando um encadeamento entre história, músicas e o cenário.

Já sobre a naturalidade das situações, há alguns pontos a serem tratados. Há certa artificialidade em alguns momentos, como quando o carro de Terpins quebra pela segunda vez. Ou, então, cenas ensaiadas que dão a deixa para a animação vir à tela. Atrapalha um pouco e tira o propósito do filme. No entanto, é de se admirar como a edição soube ampliar algumas entrevistas para essa naturalidade vir à tona, como uma briga entre o produtor do Joelho de Porco e um transeunte do centro de São Paulo.

O roteiro também possui altos e baixos -- mas com destaque para os pontos positivos. Sobre o que atrapalha: o documentário não é para leigos. Difícil mergulhar no tema logo de cara e quem tem pouco conhecimento sobre a história fica perdido. São muitos nomes, muitos personagens, muita coisa acontecendo por trás da banda. Você pode até se acostumar com a história toda, mas dificilmente vai aproveitar o documentário como um todo.

Mas vale ressaltar que o roteiro é esperto no encadeamento das entrevistas -- sem Caetano Veloso, como o trailer espertamente ressalta -- que vão dando o tom sobre a vida de Tico e do grupo punk rock. Ainda que alguns entrevistados pouco acrescentem e outros sejam verdadeiros chatos -- como é o caso de Próspero, ex-Joelho de Porco --, tudo flui de maneira natural e num ritmo esperto, que vai atiçando a curiosidade do espectador.

Há de ressaltar um outro aspecto que incomodou. Em determinado momento da trajetória da Joelho de Porco, o argentino Billy Bond entrou e adotou um estilo mais agressivo nas interpretações e composições. Ele, porém, acabou tendo uma briga feia com Tico, abandonando o grupo musical.

Rafael Terpins, em determinado momento do documentário, tenta falar com Billy, que nega cordialmente. Só que, em todo filme, o rosto do argentino é borrado, como se ele tivesse proibido sua imagem. Estranho isso. Pelo tom da mensagem enviada ao diretor, não parece que haveria tal proibição. Se foi uma mera escolha do diretor, erro feio e grosseiro. É falta de respeito com a memória da banda e do músico. Ficou feio.

Ao final, Meu Tio e o Joelho de Porco é um bom documentário nacional sobre a cena punk paulistana. É bem filmado, bem editado, com boas entrevistas e uma direção competente, que sabe o que está fazendo. Além disso, é preciso reafirmar a importância cultura e histórica do longa-metragem, que ajuda a recuperar uma memória musical que está se perdendo com o tempo. É importante ter mais produções como essa.

 

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