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Foto do escritorMatheus Mans

Crítica: 'Meio Irmão' emociona, mas falha ao não se arriscar


Sandra (Natália Molina), de repente, se vê sem mãe. Não que ela tenha morrido ou coisa do tipo. Ela simplesmente sumiu, sem deixar recado. Sem saber o que fazer, a menina -- ainda menor de idade -- começa a se virar. Rouba comida, pega dinheiro com o pai, começa a entrar escondida na casa do seu meio-irmão Jorge (Diego Avelino). E é quando começa outra história.


O rapaz, negro, da periferia de São Paulo e gay, presencia um crime de homofobia contra um casal de amigos. Filme, espanta os criminosos. Depois começa a ser chantageado. Se publicar o vídeo, morre. Se abrir a boca, morre. Jorge, então, entra num inferno astral em sua vida, quase que centralizada no trabalho que faz com o pai arrumando câmeras. E aí chega Sandra.


Esta é a história de Meio Irmão, longa-metragem que ganhou importantes prêmios na Mostra Internacional de Cinema de SP, em 2018, e chega no circuito nesta quinta-feira, 3.


Antes de tudo, é importante ressaltar: a diretora estreante Eliane Coster é brilhante. Mesmo Meio Irmão sendo seu primeiro filme, a cineasta possui um controle de cena que salta aos olhos. Tudo ali parece real, nada parece encenado. As situações se desenvolvem, se deixam acontecer. O tom documental, porém, em momento nenhum atrapalha ou tira o foco do filme. Tudo flui.


Há uma semelhança interessante, aliás, entre a direção de Coster com a de Alexandre Moratto no ótimo filme Sócrates. A trama e os estilos de direção estão em um constante diálogo.

Além disso, que acerto o casal de protagonistas. Molina e Avelino (O Animal Cordial) entendem seus personagens e entram de cabeça na interpretação. Ela é chata, pra baixo, de olhar sempre voltado ao chão. Mas a situação exige compaixão. Causa emoção na audiência. Ele, enquanto isso, é do tipo que não se deixa transparecer. Mas numa escapada no olhar, tudo pode desabar.


São dois atores que se complementam bem e levantam a trama a partir do segundo ato, quando Coster começa a perder um pouco do controle da narrativa. Os dois, juntos, são o motor do filme.


Vale ressaltar, também, como o roteiro é esperto ao trazer alguns temas meio que perdidos no cotidiano da narrativa. Homofobia, preconceito, solidão, depressão, periferia -- aliás, que bom acerto rodar o filme na zona leste de São Paulo! O filme, acima de tudo, tem alma, tem pegada, tem personalidade. Coster sabia o que queria falar. E falou, com força e propriedade.


No entanto, como disse no título, faltou se arriscar mais. Faltou concluir melhor a narrativa. Com quatro histórias em aberto -- a de Sandra, de Jorge, da mãe desaparecida e do pai sonhador --, falta estofo para um contorno mais dramático e impactante ao seu final. Depois de tantas emoções e tantos bons momentos espalhados, falta algo que alavanque a narrativa para o todo.


Lembra Sócrates? O final também não tem resolução. Mas há um cena final para os personagens -- e aí está a diferença entre as coisas. Uma cena final, aliás, que é marcante.


Enquanto isso, Meio Irmão termina sem algo interessante para ser lembrado. Não que um final sem força desmereça toda a produção -- não é à toa que, mesmo assim, a avaliação é positiva. Nem pode ser considerado um "final aberto", já que a diretora/roteirista tenta dar conclusões aos personagens. O que falta é densidade. Muita coisa fica perdida. E isso vence na memória.

 
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