Hoje, ao pensarmos nas grandes produtoras brasileiras, confesso que a primeira que chega na minha cabeça é a mineira Filmes de Plástico. Nascida em Contagem, a empresa produziu filmes nos últimos anos que traduzem o Brasil -- Temporada e No Coração do Mundo são apenas dois exemplos certeiros, que rasgamos elogios aqui no Esquina. Agora, eles chegam em outro nível com Marte Um, longa-metragem que chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira, 25.
Dirigido e roteirizado por Gabriel Martins (do próprio No Coração do Mundo), o longa-metragem conta a história de uma família em 2018, justamente quando Jair Bolsonaro chegava ao poder. Eles, na periferia mineira, não têm nada a ver com o que o atual presidente do Brasil prega. A mãe é diarista, pegando vários ônibus pro serviço. O pai é porteiro. A filha, lésbica. O filho sonha em ser cientista, apesar da insistência do pai para que ele seja jogador de futebol profissional.
É a partir desse mosaico que Martins cria um panorama social potente, mostrando como são vários brasis dentro do Brasil. Como o Brasil de Bolsonaro não é único e nem sempre verdadeiro. É um filme-protesto que, mesmo sem falar diretamente sobre política, faz política ao criar reflexões no público do outro lado da tela. Muito disso por conta de um roteiro que sabe como lidar com a contemporaneidade do Brasil, com todas as suas mazelas e violências.
Outro destaque é o elenco. Cícero Lucas (o filho Deivinho), Carlos Francisco (o pai Wellington), Camilla Damião (a filha Eunice) e Rejane Faria (a mãe Tercia) conseguem lidar com as complexidades de suas relações, com personagens exageradamente reais e, por isso, ainda mais doloridos dentro do contexto em que vivemos. Incrível como a Filmes de Plástico sabe como escolher bem seus atores e, com isso, entregar a naturalidade necessária em cena.
Uma pena, porém, que o filme cometa derrapadas -- principalmente de roteiro, esse texto de Martins que acerta tão bem na hora de criar o mosaico que comentamos. Algumas situações são pouco críveis, como a questão envolvendo o colega de Wellington. Outras, enquanto isso, são pouco contextualizadas ou até mesmo um pouco forçadas, como a questão de saúde emocional envolvendo a mãe. Fazem sentido no que Gabriel quer contar, mas não dentro da trama.
Isso tira peso do filme. Tira impacto. Ainda assim, Marte Um é um dos grandes filmes brasileiros de 2022, mostrando como temos mentes pensantes, reflexivas e pertinentes na produção audiovisual brasileira. Mesmo em tempos que o cinema é atacado constantemente, acham uma forma de bater de frente e mostrar nossa gente. Isso arrepia, empolga, emociona. Por isso, fica aqui a dica, inclusive: se tiver oportunidade, veja no cinema. Com certeza a experiência é melhor.
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