Geralmente, quando você pensa em xenofobia, o que chega em sua mente? Muitas vezes pensamos em pessoas xingando estrangeiros ou, então, até mesmo os agredindo. Pensamos em coisas mais físicas ou verbais, escancaradas, que podem ser facilmente identificáveis. Mas e quando esse preconceito, no caso contra estrangeiros, surge de maneira quase imperceptível?
É justamente sobre esse preconceito nas entrelinhas que trata Listen, belíssimo longa-metragem que está em exibição na 45ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. Dirigido pela estreante em longas Ana Rocha, o filme acompanha uma família portuguesa em situação de pobreza no Reino Unido. Eles não conseguem mais sustentar direito seus filhos, inclusive.
A situação chega em um extremo, porém, quando a filha do meio passa a ter problemas com o aparelho auditivo. Mãe e pai não conseguem comprar outro. O que fazer? Enquanto tentam tomar alguma decisão, porém, a assistência social bate na porta e leva os três filhos — o mais velho, a menina do meio e uma bebê — embora. Vão para a adoção, alegando maus-tratos.
A partir daí, Listen coloca o espectador em uma verdadeira espiral de desespero. Os pais ficam correndo para todos os lados tentando salvar as crianças, mas não encontram meios. O sistema é brutal, é cruel. A xenofobia ganha contornos mais graves conforme os responsáveis tentam se comunicar com os filhos ("só inglês, senão encerramos por aqui!", exclama o assistente social).
É desesperador, triste e brutalmente real. Apesar de ser uma realidade pouco distinguível para muitas pessoas, esse é um tipo de preconceito que nasce de maneira sistematizada, de uma estrutura que não quer saber do "estranho" — aquele que vem de terras estrangeiras. A separação que vemos na tela não é natural, tampouco coeso. É violenta, é sem necessidade.
Ana Rocha, que também é atriz, sabe amplificar essa sensação de desespero justamente com as atuações fortes do elenco. Crianças e adultos trabalham em sintonia e sentimos aquela falta de rumo que aflige. A mistura de tons de Ken Loach com Projeto Flórida é interessante e mostra um controle considerável de Ana na direção. É pra ficar de olho em seus futuros trabalhos.
Uma pena, porém, que o roteiro seja o calcanhar de Aquiles de Listen. Muita coisa não é resolvida por conta do final apressado demais. Uma reviravolta no meio não tem nenhum tipo de consequência. Fica estranho demais essa resolução apenas jogada no ar. O filme ainda é bom, ainda é interessante. Mas fica a sensação de que poderia ter sido mais completo, mais redondo.
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