Ainda que seja tratado como um filme único, o novo longa original da Netflix, Legado dos Ossos, faz parte de uma trilogia que ninguém mais ouviu falar. Inteiramente dirigida por Fernando González Molina e inspirada em livros de Dolores Redondo, a saga começou com O Guardião Invisível, em 2017; depois Legado dos Ossos, em 2020; e terminará com Ofrenda a la tormenta.
No entanto, como ressaltado, esta é uma história única. A inspetora Amaia Salazar (Marta Etura) transita entre crimes, histórias e investigações. Por mais seja interessante seguir a ordem de filmes lançados, dá para começar por esta novidade da Netflix. Pouca coisa se perde -- como a relação da protagonista com a mãe ou, ainda, com o marido. Mas não impacta aqui diretamente.
Em Legados dos Ossos, Salazar é confrontada com três mistérios. Por um lado, uma igreja espanhola foi profanada com destruição de alguns itens sagrados e, principalmente, com uma espécie de ritual envolvendo ossos. De outro lado, dois tipos de crime se tornam comuns à inspetora: os suicídios de homens, que deixam uma mensagem cifrada; e a morte de mulheres.
A partir desse caldeirão de acontecimentos, a protagonista precisa colocar uma ordem em seus pensamentos e descobertas para entender como tudo está relacionado e como deve se resolver.
Molina, por mais que se valha de uma fotografia inspirada e de bons atores em cena, não consegue sair do óbvio. Com um estética que vem se banalizando desde o excelente O Segredo dos Seus Olhos, o longa-metragem aposta numa mesma fórmula. É a inspetora confrontada com diferentes mistérios, todos eles perigosos, enquanto tenta lidar com sua vida pessoal.
É um tipo de história que já se tornou desinteressante. De novo: Etura (Cela 211) está bem como uma protagonista forte, confrontada por seu passado. No entanto, a trama não avança e tampouco favorece sua atuação. A sensação é de que os filmes criminais de fora dos Estados Unidos entraram num ciclo de repetição, de formatos, de obviedades. Nada aqui sai do lugar.
Recentemente, por exemplo, a Netflix lançou o péssimo O Silêncio da Cidade Branca. Repare na semelhança com Legado dos Ossos. A trama, os dilemas, os personagens... Tudo é plastificado.
Além disso, vale ressaltar: o roteiro de Luiso Berdejo, aqui em Legado dos Ossos, não deixa margem para dúvida. Com dez minutos de filme, a falta de delicadeza em expôr a trama já dá indicativos de como ela vai terminar. Com um pouco mais de atenção, dá até para entender como ela vai se desenrolar. De novo: com dez minutos de filme! Falta uma maior delicadeza.
Enfim: Legado dos Ossos é fruto de uma pasteurização do cinema de suspense fora do grande circuito americano. O mesmo clima, a mesma fórmula, os mesmos dilemas, enquanto o crime se torna apenas um penduricalho dentro de algo maior. Vai agradar quem busca um suspense vazio de qualquer originalidade, apenas para passar o tempo. De resto, deve decepcionar...
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