Logo na primeira cena de Helen, a personagem-título dá tchau para a amiga da escola e entra na porta de sua casa, no bairro do Bixiga, em São Paulo. Logo, fica evidente que é um cortiço: são várias famílias amontoadas naquele espaço, curvas e esquinas para todos os lados, pátios internos. No final do percurso da garotinha, há sua avó (Marcélia Cartaxo) lhe esperando.
A partir daí, o espectador já começa a ter várias questões: quem são essas duas? Onde estão os pais da menina? Como elas sobrevivem? Como a avó sustenta a menina? O que as colocou ali?
O cineasta estreante André Meirelles Collazzo, então, vai aos poucos respondendo essas questões e trazendo outros assuntos à tona. Fala sobre essas famílias que vivem à margem, os efeitos da pobreza na vida de crianças e coisas do tipo. É uma crônica social, aparentemente inspirada em uma história real, que surge a partir da história dessas duas personagens.
Na superfície, não é nada demais. Afinal, Helen fala sobre histórias que já vimos aos montes por aí de diferentes maneiras. No entanto, ao se aprofundar nessa relação delicada entre avó e neta, Collazzo evidencia a história. Mostra essa configuração de família tão forte e real, em que avós e avôs assumem a criação de seus netos -- sendo que filhos/pais vivem distantes ou ausentes.
O coração de Helen é, indiscutivelmente, Cartaxo (que brilhou recentemente em Pacarrete). A atriz, que merecia reconhecimento internacional por seus recentes trabalhos, se entrega de corpo e alma ao seu papel. A Dona Graça é forte, uma espécie de âncora na vida da neta Helen, e que ganha camadas com a atuação memorável de Cartaxo. É um espetáculo na tela.
O roteiro dá algumas derrapadas aqui e ali, perdendo o ritmo em alguns momentos e andando em círculo em outros. Fora que algumas subtramas importantes, como a relação de Helen com um vizinho, ficam perdidas. Mas não importa. Helen é um dos grandes filmes nacionais de 2021, com uma história real, poderosa e de realização. Nos lembra dessas pessoas à margem.
Em tempos de pandemia, em que o pobre ficou mais pobre, e famílias foram ainda mais à margem da sociedade, é importante lembrar, conhecer e mergulhar na rotina dessas pessoas com configurações familiares tão particulares. É um filme que não busca ser grandioso, mas que, por meio de sua simplicidade, exerce sua função primordial: emocionar e transformar.
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