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Foto do escritorMatheus Mans

Crítica: 'Guerra Civil' traz diferentes visões sobre a violência



Há algum tempo, estava lendo algum post perdido no Twitter sobre Guerra Civil, filme que chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira, 18. Alguém questionava, bastante incomodado, como o filme iria justificar uma aliança entre Texas e Califórnia, como sugere o trailer. O autor do post dizia que o diretor Alex Garland daria um jeito. O fato é que, ao assistir ao filme, essa questão banal, sem importância, não saía da minha cabeça. A resposta? Garland apenas não justifica.


Afinal, Guerra Civil tem um conflito -- de diferentes grupos guerreando nos Estados Unidos dividido ao meio -- como um cenário, não como fim. Alex Garland, que tem no currículo o visceral Ex-Machina, já explorou assuntos diversos em sua filmografia, mas sempre com um foco bem compartimentado: os limites da tecnologia no já citado Ex-Machina, a natureza contra o homem em Aniquilação, o machismo no fraco Men. Aqui, o foco único e central é a violência.


Para falar sobre isso, a história do longa-metragem passa por quatro figuras: os jornalistas Joel (Wagner Moura) e Sammy (Stephen McKinley Henderson) e as fotojornalistas Lee (Kirsten Dunst) e Jessie (Cailee Spaeny). Enquanto a Guerra Civil se desenrola nos EUA, eles entram em um carro com um objetivo bem claro de chegar até a capital americana para entrevistar o presidente e fazer algumas fotos antes de uma possível invasão de aliados de Texas e Califórnia.



É nessa jornada que vamos descobrindo, aos poucos, as intenções de Garland. Ele nunca, em momento algum, se preocupa em explicar o conflito ou até mesmo colocar flashs do que está acontecendo em todo o país -- o que poderia ser um recurso fácil, com algumas TVs transmitindo por onde passam como andam as coisas, por exemplo. Mas é isso: Garland não quer falar sobre um conflito fictício. É um desejo consciente do cineasta e roteirista.


Isso, por um lado, enfraquece um bocado a narrativa de Guerra Civil. Se pensarmos em conceitos de antiviolência, o longa-metragem derrapa bastante no que esperamos de um filme que busca discutir os caminhos da humanidade e coisa do tipo. Garland parece lavar as mãos sobre tais comentários, afastando o filme da politização. Caindo em um limbo, fica evidente que o filme pode ser cooptado por diferentes ideologias (até aquelas mais bizarras e equivocadas).


Mas, mesmo enquanto não politiza sua narrativa e derrapa em conceitos fundamentais da antiviolência, Garland cria aqui um tratado profundo (e bastante perturbador) sobre como a violência nos molda e abala. Moura (Tropa de Elite) e McKinley Henderson (Duna), ambos muito bem, acabam sendo apenas coadjuvantes do show de Dunst (Homem-Aranha) e Spaeny (Priscilla). São elas que comandam essa análise quase psicanalítica do impacto da violência.



Lee, uma veterana, parece já estar moldada pela violência ao seu redor. Tangida em aço. Diz que não se lembra dos EUA em tempos de calma (rebatida por uma frase meio piegas, mas muito boa de Sammy), tira foto de pessoas torturadas e pensa friamente enquanto o mundo desaba ao seu redor. Já Jessie é o oposto: ela é nova, tem apenas 23 anos, e está começando a se acostumar com as bombas estourando ao seu redor, com atentados, com mortes, com tiros.


É nesse caminho que devemos prestar atenção para perceber como o filme avança. Como essas duas personagens se transformam. Como caminhos, antes óbvios, seguem rumos inesperados.


Além disso, Garland explora bastante toda a questão imagética da história -- deixando de lado, de novo, qualquer blá-blá-blá didático sobre o que é o conflito. Com duas fotojornalistas como protagonistas absolutas (e com duas grandes atuações), o diretor e roteiristas quer compreender melhor como a imagem retrata o conflito, criando até mesmo uma espécie de metalinguagem para entender como o seu cinema é capaz de criar e manter todo aquele clima.


A foto que interrompe o som brutal, por exemplo, é Garland se colocando na tela -- assim como o clique de Jessie na câmera analógica de seu pai. A imagética da guerra é uma construção, afinal. Mas a violência que molda pessoas, não. O mundo está em ebulição, mas como contar as histórias corretamente? Como colocar tudo em ordem para que as pessoas compreendam? É aí que entra Garland, Jessie, Lee. Guerras fictícias ou não, precisamos de contadores de histórias.


E é nessa mistura entre a compreensão dos caminhos da violência com a imagética da guerra que Guerra Civil brilha. Não é um filme brilhante talvez por essa questão do diretor tirar o pé de um posicionamento mais firme em algumas questões que urgem ali, mas que ele joga para debaixo do tapete -- o nacionalismo exacerbado, por exemplo, grita, mas o máximo que o filme chega é na cena (sensacional) com Jesse Plemons. Mas, ainda assim, é um grande filme.

 

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