O drama nacional Foro Íntimo é mais uma daquelas histórias que podem ser absorvidas de dois modos. Em um primeiro momento, pode ser encarada como um filme de tribunal ao acompanhar a vida de um juiz (Gustavo Werneck) tentando condenar um grupo de políticos corruptos. Por outro lado, também pode ser visto como um drama abstrato que mostra o isolamento desse juiz que quer manter a sanidade num sistema burocrática e perverso. Tudo ao seu redor é perigoso. A sensação de perseguição é total.
E é esta segunda história que salta aos olhos em Foro Íntimo, primeiro longa-metragem do premiado Ricardo Mehedff (Um Branco Súbito). Cheio de linguagens e subtextos, a trama coloca o espectador na mesma situação do juiz-protagonista. As paredes do tribunal se tornam celas ao redor de Gustavo. E todos ao seu redor, inclusive os que trabalham para o seu bem, se tornam suspeitos de uma conspiração maior. O espectador, assim como o personagem, é colocado num estado paranoico crescente.
O mérito desse sentimento é, claro, de Mehedff. O cineasta é talentoso e cria um clima de isolamento no longa-metragem. A tela, em proporções de 4x4, causa a sensação de estrangulamento e claustrofobia. O preto e branco da fotografia amplia a sensação de enclausuramento, além de falar muito sobre a situação monocromática do protagonista que se encanta com pessoas num ponto de ônibus. As brincadeiras narrativas, mexendo com o tempo da história, também ajudam a amplificar toda a situação de confusão.
Destaque também para a direção de fotografia de Dudu Miranda (Lixo Extraordinário), que soube valorizar a arquitetura do tribunal de Belo Horizonte, onde o filme foi rodado.
Gustavo Werneck (Bastimo de Sangue) também apresenta um bom desempenho. É crível a situação de desespero e paranoia de seu personagem. Pena que ele não tem outros personagens de suporte para sua atuação, limitando um pouco o alcance de seus dramas. Talvez se o roteiro tivesse se dedicado um pouco mais para o desenvolvimento das figuras do seguranças ou, ainda, da secretária, Foro Íntimo teria ganho mais algumas camadas que o deixariam mais saboroso, desafiador e, é claro, interessante.
Por fim, Foro Íntimo é um filme provocativo, de significados abstratos e que instiga o espectador. As boas técnicas usadas por Mehedff ajudam a fazer com que a experiência de assistir ao longa-metragem se torne memorável. É diferente do usual, é o cinema brasileiro mostrando e comprovando como é diverso, ousado e criativo. Vale assistir.
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