Violet Jones (Sanaa Lathan) tem uma vida aparentemente impecável. O relacionamento vai bem com o namorado Clint (Ricky Whittle) e o emprego, numa agência de publicidade, vai de vento em popa. No entanto, de uma hora pra outra, as coisas saem dos trilhos: ela sofre um acidente num salão de beleza e perde o cabelo, enquanto Clint, contrariando expectativas, não a pede em casamento numa aguardada festa. É aí que Violet percebe a rotina artificial que ela estava vivendo. Não era o que queria, de fato.
A partir daí, a diretora saudita Haifaa Al-Mansour (do excepcional O Sonho de Wadjda) e os roteiristas Adam Brooks (Mozart in the Jungle) e Cee Marcellus criam uma trama extremamente morna. É um drama muito pessoal, sempre ao redor da personagem de Sanaa Lathan (Alien vs Predador), e que não consegue se aprofundar na maioria dos aspectos de sua trama, como insatisfação no trabalho, romances sem amor e problema de relacionamento familiar e que parecem fugir de suas mãos e de controle.
Tudo se sucede de maneira pouco agradável e sem grandes momentos em tela. Não há conflitos na maioria desses aspectos e, por isso, a trama parece apenas transitar em uma superfície de ideias. Há uma subtrama envolvendo Violet e a garotinha Zoe (Daria Johns) que é totalmente jogada e serve apenas como um fraco ponto de partida para a transformação da protagonista. Fica um pouco solto e, até mesmo, um pouco irritante.
O elenco também não consegue entregar grandes atuações, com exceção de Lathan. Ricky Whittle (American Gods) apresenta uma interpretação extremamente apática, sem vida. Daria Johns (do vindouro Animator) até se esforça, mas a personagem não ajuda. Os atores que interpretam os pais de Violet (Lynn Whitfield e Ernie Hudson) também são prejudicados pelo roteiro, mas se esforçam para dar um pouco mais de vida para a trama, para os acontecimentos e, até mesmo, para o humor involuntário.
Mas, ao contrário do que parece, o filme não é um desastre completo por conta de um ponto: a originalidade e a sagacidade do acontecimento que permeia toda a trama de Felicidade por um Fio. A transformação da personagem é, justamente, a perda do cabelo e os questionamentos que circundam sua beleza. Ela é negra, tem um belíssimo cabelo cacheado, mas nasceu e cresceu sendo ensinada -- pela mãe e pela sociedade -- de que aquele tipo de penteado não era bonito. A ordem, para ela, era o liso e "moderno".
Ainda que esse questionamento da protagonista pelo estilo de seus fios não consiga causar acontecimentos e uma trama interessante e aprofundada, a mensagem e essa forte motivação de "viva o que você é" dá peso ao longa-metragem da Netflix. Assim como em O Sonho de Wadjda, no qual a protagonista repensa toda sua vida a partir do desejo de andar de bicicleta numa sociedade machista, em Felicidade por um Fio toda a vida é repensada a partir desse desejo estético, mas coibido ao longo dos anos. É muito bom de ser ver isso.
Felicidade por um Fio é um filme extremamente abaixo de outros da diretora Haifaa Al-Mansour, já que não consegue se aprofundar, de fato, na história e na transformação de sua protagonista, deixando tudo muito superficial e sem grandes momentos. No entanto, ganha alguns pontos com sua mensagem e seu ponto de partida, original e diferenciada com relação ao que é produzido por aí. É um filme pra cima, original, e que pode agradar, ainda que não tenha uma grande história ou aprofundamento. Exemplo perfeito de feel good movie.
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