É urgente a necessidade de falar sobre autismo no cinema nacional. Ainda que haja a estimativa de quase duas milhões de pessoas estejam no espectro autista no Brasil, ainda não há longas -- seja de ficção ou documental -- que se aprofundem na temática. Então, é feliz a iniciativa dos diretores Flavio Frederico e Mariana Pamplona (Boca do Lixo) com Em Um Mundo Interior.
Integrante da programação da sessão especial Projeta às 7, do Cinemark, o longa mostra a rotina de sete famílias brasileiras que precisam lidar, diariamente, com os desafios do autismo. Diferente de um Big Brother, porém, a dupla de cineastas opta por focar em momentos específicos, como a ida à escola, os tratamentos, as refeições e a relação com amigos.
Outro acerto fica na escolha das famílias. Ainda que falte o relato de pessoas bem mais pobres -- como apenas é citado num rápido momento do longa-metragem --, é possível ver uma boa diversidade na tela. Há pessoas de diversas regiões do País, de diferentes etnias, diferentes sexos e, principalmente, diferentes gravidades com relação à condição neurológica.
Isso, então, acaba dando dinamicidade e permitindo que a audiência compreenda todas as camadas e especificidades do autismo.
Só que os dois diretores levam o didatismos ao extremo e parecem fica com receio de inovar no formato. Afinal, as histórias contadas, por si só, já mostram os detalhes do autismo e como essa condição difere de uma pessoa pra outra. Falta, então, poesia na hora de filmar. Falta lirismo na forma que essa mensagem é levada. No final, ela fica bruta, crua e ressonando a todo o tempo seu conteúdo. Isso cansa e não traz inovação à audiência.
Até as músicas de abertura e encerramento -- O Quereres, de Caetano Veloso; e Paciência, do Lenine -- são óbvias demais, ainda que tragam uma boa ambientação ao filme.
Além disso, há alguns erros básicos em relação à técnica. Há várias tentativas de inovar na narrativa, mas que são abandonadas ou que não surtem o efeito necessário e, mesmo assim, vão para o filme. Várias vezes também aparece microfone na tela ou o câmera num canto.
Como sempre falamos aqui no Esquina, é preciso lembrar que um documentário não é uma reportagem. É um filme. É cinema! É preciso levar a linguagem ao longa-metragem, como seria feito em qualquer filme ficcional. Esses erros técnicos não podem ocorrer, assim como não pode existir essa ausência completa de narrativa. É erro recorrente, mas básico.
Em Um Mundo Interior, então, é um filme urgente, necessário, didático e bem produzido. Falta, então, um cuidado maior para tirá-lo da zona da reportagem para entrar, de vez, no mundo do cinema. Isso, claro, não diminui a importância do filme, mas tira um pouco de seu peso. A torcida agora, claro, é que novas produções surjam para desmistificar o autismo. É necessário.
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