Confesso que fui assistir a Elvis, cinebiografia que chega aos cinemas nesta quinta-feira, 14, não com um pé atrás, mas com os dois. Afinal, no meu pensamento, o filme tinha tudo para dar errado. O ator Austin Butler, intérprete de Presley, é pouco experiente e parece não ter saído mais do personagem. O diretor, Baz Luhrmann (O Grande Gatsby), sempre tenta ser a principal atenção de seus filmes. E, cá entre nós, os filmes sobre grandes nomes da música pereceram.
Só que estava errado. Muito errado, em cada um dos pontos. Elvis tem erros, vários erros que falaremos a seguir. No entanto, a cinebiografia consegue ter algo raro de se ver: tem vida de sobra. Tudo aqui começa pela boa sacada de roteiro, assinado por Luhrmann, Sam Bromell (The Get Down) e Craig Pearce (Moulin Rouge): nada daquela história batida, com nascimento, vida e morte do biografado. Tudo, aqui, é contado pela visão de Colonel Tom Parker (Tom Hanks).
Ele era empresário de Elvis. Para alguns, a pessoa que criou a figura do roqueiro. Para muitos, o responsável pela sua derrocada. Com isso, ele vai dando sua versão dos fatos e a história nunca segue aquele trajeto regular, banal. É viva. Muito disso também vem da edição que, apesar de um pouco confusa no início e irregular em questão de ritmo, sabe como dar uma estética mais original ao longa. O começo, cheio de tela dividida, brinca com a percepção temporal do público.
Depois disso, vamos para outro acerto inesperado: Baz Luhrmann. O diretor australiano, que sempre se coloca em evidência nas próprias histórias, mostra que sabe dirigir: não trata a história como mais do mesmo, colocando camadas na sua leitura. A partir desse roteiro vivo e contando com uma edição criativa ao seu lado, ele vai balanceando a forma do filme se mostrar e ousa com a câmera. A imagem vem, vai, some, reaparece. Visualmente, é o filme do ano.
No entanto, o grande acerto tem nome e sobrenome: Austin Butler. O ator, que vem de uma carreira sem qualquer grande expressão artística, é o nome do filme. Ele se transforma não apenas visualmente, mas também de maneira emocional. Ele não está interpretando Elvis Presley; ele é Elvis Presley. Isso é muito forte e coloca uma carga emocional de destaque no filme, como não se vê por aí. Nem Malek, nem Egerton. Foi Butler que conseguiu ir além.
Mas lembra que eu disse que o filme tem alguns probleminhas? Pois bem. Como toda cinebiografia com alguma amarra e medo de retratar o protagonista de maneira pejorativa, Elvis passa pano pro roqueiro, escondendo seu passado violento. Hanks, apesar de bem no difícil papel de Colonel Tom Parker, tem seus momentos de exagero e a maquiagem está densa demais. A duração é excessiva, de 2h40. E o ritmo do filme simplesmente não se decide.
Além disso, o pior: lá pro final do filme, entre o segundo e o terceiro ato, há um claro excesso. Uma gordura, que deveria ter sido tirada na sala de edição, com situações se repetindo à exaustão. Quando Elvis vai fazer uma turnê em um hotel de Las Vegas, a informação de que ele não está feliz é colocada várias e várias e várias vezes na tela, dos mais variados jeitos. Mostra que o filme não precisava ser tão longo e que a edição, apesar de criativa, deveria ter ido além.
Mas é isso. Apesar desses problemas centrais, que devem afastar parte do público, Elvis cumpre com seu papel. É empolgante, é visualmente atraente, bem dirigido e, acima de tudo, com uma atuação que eterniza Elvis Presley nos cinemas. Butler está irretocável. Difícil pensar que algum outro ator possa, em um futuro próximo, interpretar Presley novamente sem ficar à sombra. Austin Butler, apesar de novo e inexperiente, deixou sua marca com um filme que vale a visita.
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