Logo na primeira cena de Elena Sabe, o espectador se depara com uma imagem impactante: uma senhora (Mercedes Morán), bastante curvada e com dificuldade para andar, está tentando encontrar caminho em uma estação de trem. As pessoas passam apressadamente ao seu lado, sentam e não dão lugar, ignoram sua existência. Ela tenta, mas não consegue mais continuar.
Essa cena é o primeiro contato com Elena, essa protagonista machucada pela vida que lidera o longa-metragem argentino da Netflix que estreou nesta sexta-feira, 24. Dirigido por Anahí Berneri (do bom Alanis) e roteirizado por Gabriela Larralde (O Presidente), o filme é, sobretudo, sobre mulheres. Sobre Elena, essa mulher com uma vida cheia de obstáculos, tal qual a estação, que é impedida de continuar pelo Parkinson, pela solidão, pela morte de sua filha.
A partir daí, acompanhamos um mosaico na vida de Elena. É a gana de descobrir quem está por trás do assassinato de Rita (Erica Rivas), são os flashbacks que mostram com mais detalhes a relação das duas, a forma com que Elena se relaciona com o entorno e com todos os outros.
Elena Sabe, assim, parte de uma trama criminal para uma história pessoal de luto; parte de uma relação atribulada entre mãe e filha para compreender melhor como isso foi construído em um cenário que não há espaço para o amor; parte de um sistema burocrático para fazer o diagnóstico de um Parkinson mais complicado para uma burocracia na ponta, nas farmácias.
Há algo de bom por aqui, principalmente quando o texto de Larralde tenta compreender os caminhos da dor dessa personagem, interpretada com força por Morán. Uma pena, porém, que o filme demore tanto a engrenar -- e a fazer com que o título, Elena Sabe, ganhe um sentido absolutamente doloroso. Faltando uns 30 minutos pra acabar, a protagonista vai tomar satisfações com uma estudante. Passa do ponto. Faz cobranças. E entendemos o que ela sabe.
A partir disso, o filme só cresce. Depois dessa primeira hora andando em círculos, tentando nos mostrar o caminho, mas sem nunca iluminar demais a proposta, o longa-metragem argentino vai além da trama sobre burocracia e relacionamento entre mãe e filha, para falar sobre aceitação da morte, ainda mais nas circunstâncias que se mostram aqui. A culpa pesa nos ombros dela, que parece ficar cada vez mais curvada. A dor ganha força e o mundo escurece.
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