Em 2018, durante a campanha presidencial entre Fernando Haddad (PT) e Jair Bolsonaro (hoje, sem partido), Mano Brown subiu no palanque. Convidado pelo PT, a ideia era que o líder dos Racionais partisse para aquele tradicional discurso para defender a democracia, apoiar Haddad e por aí vai. No entanto, Brown seguiu por outro caminho e tentou abrir os olhos da esquerda.
Segundo ele, naquele discurso que viria a se tornar histórico, era chegado o momento da esquerda e do PT entenderem o que era e como se formou essa onda de conservadorismo. Como e onde a esquerda errou quando estava no poder? Será que não haviam se afastado do discurso de defender os pobres e trabalhadores? Será que não era hora de voltar às bases?
É em cima disso que se debruça o importante documentário #EAgoraOQue. Apesar do péssimo título, este filme exibido na 44ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo vai fundo nessa questão tratada por Mano Brown no palanque do PT: será que não era momento da esquerda deixar de ser apenas reativa? Não é momento de deixar o blá-blá-blá de lado e partir pra ação?
Dirigido por Rubens Rewald (Super Nada) e Jean-Claude Bernardet (Através da Janela), o filme é um estremecimento. Um filme desconforto. Afinal, assumidamente feito para bolhas e para atingir única e exclusivamente a esquerda, #EAgoraOQue quer abrir os olhos. Chega! Basta!, diz o filme em incontáveis momentos. A esquerda, para Rewald e Bernardet, precisa agir.
Para ilustrar isso da maneira mais coerente possível, a dupla de diretores coloca o filósofo Vladmir Safatle contra a parede. Ele, conhecido por seu discurso difícil e para elites, é confrontado por Valmir do Côco, por um grupo de jovens da periferia, pela filha e até mesmo pelo próprio Bernardet, que encarna um papel de "sopa na mosca", de esquerda-raiz.
Alguns momentos beiram o amadorismo, principalmente quando Safatle precisa atuar ou traduzir momentos específicos de sua jornada em cena -- um momento em que Bernardet se comporta como pai do filósofo é vergonhoso. No entanto, a mensagem ainda assim reverbera. Ainda assim, a maioria dos momentos do filme é pungente, é real, é provocativa.
Afinal, #EAgoraOQue finalmente tira a esquerda de um lugar-comum, de um discurso vazio às elites, para trazer um choque de realidade persistente e pertinente. A cena já citada do confronto de Safatle com um grupo de jovens periféricos é um dos momentos mais poderosos politicamente que vi nos últimos tempos. E a escolha de arquivos também é muito acertada.
Só me preocupa, enfim, que o filme entre em uma espiral do que ele mesmo critica -- como se tornar um discurso jogado ao vento, mais um blá-blá-blá frente ao blá-blá-blá. Só o tempo, e a chegada do filme aos cinemas e ao vídeo on demand, poderá dizer o que esta produção irá causar. Mas apenas o fato de termos algo concreto em relação à isso, já é um avanço. Basta!
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