Quando falamos em Dona Flor e Seus Dois Maridos, falamos de clássicos. Seja o longa de 1976 ou o livro de Jorge Amado, a história da mulher que vê o fantasma do marido morto ganha contornos positivos em nossas mentes por conta do ótimo significado da trama ou pela qualidade que foi contada. E é de forma muito arriscada, então, que o cineasta Pedro Vasconcelos decide revisitar essa história de Jorge Amado com um elenco interessante e produção duvidosa.
A história é a mesma que as pessoas conhecem: Dona Flor (Juliana Paes) é casada com o malandro Vadinho (Marcelo Faria), que vive na noite e não larga o jogo. No entanto, os dois vivem bem e se amam. Em um desfile de carnaval, porém, Vadinho tem um ataque fatal e morre. Flor, sozinha, fica desconsolada e vê a sua vida desmoronar rapidamente. Até que Teobaldo chega em sua vida e coloca a mulher numa rotina sem fim -- que é abalada com Vadinho, novamente.
O grande acerto do filme é a escolha de fazer um roteiro apenas com falas e diálogos dos livros de Jorge Amado. Nada ali é criação de Vasconcelos -- que assina como roteirista. O próprio disse, em entrevista coletiva, que o roteiro de seu filme é inteiro de Jorge Amado. Ele só costurou as situações, tirando excessos e contando apenas o que deve ser contado no audiovisual -- a relação de Flor com a mãe e a infância de Vadinho, por exemplo, ficam de fora.
Assim, apesar de alguns diálogos longos demais e momentos que não combinam com a mídia audiovisual, a história é boa e os diálogos deliciosos -- como qualquer filme que é inspirado em Jorge Amado. O problema é o quadro que é pintado a partir daí pelo diretor, que também é responsável pelo terrível O Concurso e por uma ou outra novela da Globo. Com ares de filme televisivo, o novo Dona Flor e Seus Dois Maridos, infelizmente, não se mantém nas telonas.
Primeiro grande erro: Leandro Hassum. Apesar do sucesso dele com filmes populares, o comediante não é um grande ator. Ele é engraçado, sem dúvidas. Mas não é um bom ator. A sombra de Mauro Mendonça o acompanha o tempo todo e, apesar de um ou outro bom momento, não é o bastante para agradar. Marcelo Faria e Juliana Paes, bem melhores, também roubam toda atenção do comediante. No final, Teodoro, que é tão interessante pra narrativa, fica total e tristemente apagado.
Outro erro: a forma que o filme é filmado. Com uma fotografia esfumaçada -- que já tinha sido usada em O Concurso -- o filme é ruim de assistir. Parece que não souberam regular luzes e ficou com aquele visual. A beleza das ruas da Bahia também não é aproveitada, e ganha destaque apenas na clássica cena dos três andando livremente pela cidade. Todo o visual potencial, então, é desperdiçado com esse jogo de luz que não funciona e que não é significativo.
O grande problema, porém, é a forma de Vasconcelos em contar a história. Não há respiro para o espectador apreciar o que está vendo. Não há silêncio! Em certa cena, Juliana Paes está engatando uma sequência emocionante e, do nada, estoura Maria Bethânia cantando É o Amor ou Dominguinhos com Isso Aqui Tá Muito Bom. Parece um longo capítulo de uma novela, cheio de música e sem pausas. Para um filme, definitivamente, não funciona e logo surge o cansaço na sala de cinema.
Desse jeito, infelizmente, Dona Flor e Seus Dois Maridos não funciona. Tinha potencial: era só deixar Juliana Paes e Marcelo Faria, encontrar um novo Teodoro e dar o filme para um diretor talentoso. Podia ter feito uma releitura moderna da história! Podia ter dado novos significados. Mas não. No final, o filme decepciona e não encontro justificativas para a sua realização. Por enquanto, então, ainda prefiro o filme de 1976. Ou melhor: prefiro pegar o livro na estante e revisitar Jorge Amado.
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