Cinema de resistência. Essa expressão, às vezes usada ao vazio, trata de um dos universos (e estilos de cinema) mais importantes da sétima arte, se é que podemos elencar filmes em um grau de importância. É aquele cinema que resiste a algo. Que coloca a arte em um espaço que vai além da admiração e reflexão, partindo para a acusação, para a denúncia e, como o próprio nome diz, para a resistência. E é justamente nesse espaço que Diários de Mianmar busca entrar.
Dirigido por um coletivo anônimo de cineastas do país asiático, este filme fala sobre o que aconteceu no país após o golpe militar que subiu ao poder -- e que, curiosamente, foi televisionado enquanto uma mulher fazia ginástica em frente à um monumento histórico. A ideia central de Diários de Mianmar é mostrar o que está acontecendo por lá, em um momento em que a liberdade de expressão é censurada e informações locais são vetadas pelos militares.
Por um lado, há uma potência que só o cinema consegue ter ao vermos as imagens. Sabemos que parte da população está resistindo, protestando, colocando sua voz. Há muita violência, pessoas presas, repressão. A denúncia é contundente, mesmo quando não fica tão claro o que está acontecendo nas ruas birmanesas. Há urgência no relato, até mesmo certo desespero. Há coragem também, certeira e absoluta, que mostra como é importante colocar Mianmar à luz.
No entanto, a importância de Diários de Mianmar parece que fica por aí. O coletivo de cineastas definitivamente não conseguiu dar a roupagem de cinema que o longa-metragem exigia. Tudo visto ali é um pouco corrido demais, apressado. Muitas coisas não se conectam e, ainda que uma imagem valha mais do que mil palavras, faltam informações. Tudo é muito vago, aproximado. Obviamente há a dificuldade dos cineastas, mas poderia ter mais conteúdo.
A sensação é de que Diários de Mianmar poderia ser mais jornalismo de resistência do que um cinema de resistência de fato. Falta um roteiro que junte tudo em um pacote, faça a coisa andar. Falta cinema e sobra resistência. Se a coisa tivesse uma linguagem mais clara, até mesmo uma narrativa mais forte, mais potente, Diários de Mianmar seria irresistível. Seria Oscar na certa. Mas, do jeito que ficou, uma pena: sinto que vai passar invisível nos cinemas pelo mundo.
* Filme assistido durante a cobertura especial para o festival É Tudo Verdade 2022.
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