A diretora norte-americana Kathryn Bigelow surgiu silenciosa na cena cinematográfica, em 2008, com o filme Guerra ao Terror. Afinal, até então, ela só tinha dirigido filmes medianos como Caçadores de Emoções e Estranhos Prazeres. No entanto, veio a surpresa e Bigelow desbancou o ex-marido James Cameron, com Avatar, e levou o Oscar de Melhor Direção para casa. Agora, a cineasta volta com um outro filme de guerra: o real, humano e visceral Detroit em Rebelião.
Desta vez, a diretora não foi para as zonas de conflitos armados vistas em A Hora Mais Escura ou Guerra ao Terror. Desta vez, ela olhou debaixo de seu nariz e contou um caso antigo -- mas pouco conhecido -- ocorrido na cidade de Detroit, nos EUA, durante período de tensão racial. Nesta época, negros eram totalmente encurralados em cidades ao mesmo passo que policiais brancos se aproveitavam de suas posições para subjugar a população negra, indefesa.
Em Detroit, porém, a coisa começou a sair do controle quando o abuso das autoridades criou uma série de motins, revoltas e protestos contra a situação desumana. A partir daí, a gente acompanha a história de várias pessoas envolvidas nesta situação: Larry (Algee Smith, incrível), o líder negro de um grupo vocal; Krauss (Will Poulter), um policial que não liga para os direitos civis; e Dismukes (John Boyega), policial civil que cuida de lojas durante as rebeliões.
Os destinos desses três -- e de mais um punhado de personagens -- acaba se entrelaçando quando tiros são disparados de um hotel de beira de estrada e a polícia resolve parar para averiguar. E aí começa um desfile de racismo e situações degradantes para os envolvidos na situação. Como citado, Smith impressiona com sua atuação -- afinal, não tinha nada muito incrível no currículo. Poulter mostra que cresceu após o seu papel Maze Runner e Boyega, de Star Wars, está bem.
O grande destaque fica, porém, com Bigelow. A diretora repete uma mostra de seu talento para filmar situações bélicas -- ainda que, desta vez, não seja no Oriente Médio, nem tenha o exército americano como figurante. Com uma câmera tremida, que dá um ar documental à produção, a cineasta deixa a situação o mais real possível, fazendo o espectador esquecer que está vendo um longa-metragem de ficção. Apesar do ano concorrido, Bigelow merece uma vaga dentre os indicados ao Oscar.
A cena do hotel, por exemplo, já justifica essa minha última afirmação. Com um trabalho de elenco excepcional, ela consegue transmitir uma avalanche de sentimentos à audiência. É impossível sair da cena impassível. Em vários momentos, senti que precisava levantar da cadeira e impedir o que estava acontecendo de continuar. É uma sensação que apenas bons filmes e boa direção conseguem causar na audiência -- e olha que é uma sequência com mais de 30 minutos.
Ela só não entraria na corrida real pelo Oscar por conta do terceiro ato do filme. Arrastado e sem ritmo, Bigelow tira toda a sensação de efervescência que o filme estava causando na audiência até então. Faltou uma boa edição neste trecho, que poderia tirar 20 minutos de filme, no mínimo. E uma coisa curiosa, ainda sobre edição: o último frame do filme é muito parecido com uma estratégia narrativa vista em Dunkirk. Ainda estou tentando entender o motivo disso.
Detroit em Rebelião é, sim, um filmaço. Bem dirigido, conta uma história importante e que transmite sentimentos ao espectador. Pena, porém, que o último ato seja tão insosso e tão arrastado. Sem dúvidas, não é desta vez que Bigelow vai ressurgir e tirar o Oscar das mãos de Guillermo Del Toro ou de Nolan. Ainda assim, é um filme importante, marcante e que só mostra como a carreira da cineasta está se consolidando cada vez mais no cinema de guerra norte-americano.
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