A franquia De Pernas pro Ar nasceu, em 2010, com um objetivo claro: quebrar o tabu do prazer feminino, tão estigmatizado. Para isso, a produtora e criadora Mariza Leão apostou na história de Alice Segretto (Ingrid Guimarães), uma executiva workaholic que perde o emprego e, desnorteada, acaba se tornando empreendedora do ramo de artigos sexuais. Foi um sucesso de bilheteria, público e crítica. A continuação ficou assegurada, chegando nos cinemas em 2012. Agora, sete anos depois do segundo filme e nove após o primeiro, chega a conclusão da franquia com divertido e moderno De Pernas pro Ar 3.
Dirigido por Júlia Rezende (Meu Passado me Condena), que assume no lugar de Roberto Santucci, o novo filme mostra uma Alice Segretto perdida. A sócia (Maria Paula) largou a empresa de sex shop e tudo ficou em cima dela e da mãe Marion (Denise Weinberg). E, novamente, a protagonista começou a sentir problemas no casamento com João (Bruno Garcia) e no relacionamento com os filhos Clarinha (Duda Batista) e Paulinho (Eduardo Melo) -- e com o agravante deste último começar a se engraçar com Leona (Samya Pascotto), a dona de uma startup de realidade virtual que se torna rival mortal de Alice.
A trama, que se passou em Nova York no segundo filme, foi além neste terceiro capítulo e foi quase inteira rodada em Paris, a capital-luz da França. Além do luxo natural da locação, De Pernas pro Ar 3 teve uma sacada interessante de inserir a cidade dentro da lógica dos próprios personagens. Não é algo gratuito, e episódico, como em Minha Vida em Marte. Estar em Paris faz sentido dentro da trama e, junto com isso, eleve um pouco o nível geral do longa-metragem -- aliás, se não fizesse sentido, com certeza a produtora Mariza Leão não teria autorizado a viagem e nem os enormes gastos que traz.
Dito isso, vamos ao filme de fato. A história, novamente escrita por Marcelo Saback, em parceria com a própria Ingrid e com Rene Belmonte, tenta se modernizar indo além dos vibradores. Agora, a trama mergulha no mundo da tecnologia, das novas possibilidades e do feminismo, trazendo um tema intrincado de sororidade e uma independência feminina que vem surgindo aos poucos, mais lenta do que deveria. Foi, sem dúvidas, um bom gancho encontrado por Leão e pelos roteiristas, que trouxeram a história em um momento muito diferente de quando ela surgiu. O mundo evoluiu, a franquia também.
O elenco, que envelheceu junto com a trilogia, continua afinado em seus papéis -- principalmente Ingrid Guimarães, que continua engraçado mesmo sem a muleta de Maria Paula (Casseta & Planeta). Bruno Garcia (Chocante), Denise Weinberg (Greta) e, principalmente, Cristina Pereira (Fala Sério, Mãe!) continuam confortáveis em seus papéis. A talentosa Samya Pascotto (Onde Quer Que Você Esteja) faz uma boa estreia.
O humor também está mais dosado aqui. Não há nenhuma grande cena como a do estádio, em De Pernas pro Ar, ou como o diálogo da empregada Rosa (Pereira) com um garçom americano sobre garfos e facas. As coisas estão mais sutis, muitas vezes voltadas para o drama, dando um diferencial interessante ao filme. O contraste entre as personagens de Guimarães e de Samya também funciona, dando uma dimensão de como o mundo é volátil, versátil, estranho. É preciso sempre estar se atualizando.
No entanto, nem tudo são flores. O filme possui fragilidades evidentes de roteiro e sequências que servem apenas para agradar os fãs da franquia, como a participação sem nexo de Maria Paula -- o efeito que ela causa na história é esquecido em segundos na cena seguinte. O pior, porém, é que o filme possui dificuldades, em certos momentos, para carregar esse drama que vai surgindo pelas beiradas. Não é fácil dosar essas diferentes facetas. E Júlia Rezende, que é uma boa diretora, consegue só em partes.
Com isso, De Pernas pro Ar 3 é aquilo que foi os outros dois filmes. Uma produção bobinha, com algumas piadas que devem funcionar e fazer o público rir, além de um elenco afinado. Não é grande coisa, não é um deslumbre de produção. O drama, quando vem, é moderado, não se sobressai. Mas não dá pra dizer que o filme é ruim, uma vergonha ou qualquer outra coisa do tipo que as pessoas amam falar para degradar a comédia nacional. É um longa pra rir, se divertir, se entreter. E isso faz, com certeza.
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