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Foto do escritorMatheus Mans

Crítica: 'Clara Sola' reflete acertadamente sobre o impacto da religião na sexualidade


Foi sem querer que esta semana assisti a dois filmes que falam sobre a mesma coisa: a religião afetando diretamente a sexualidade. Um deles foi Leona, belíssima produção disponível no Amazon Prime Video sobre uma garota afogada pelas exigências de sua família judaica. O outro, uma inesperada produção da Costa Rica, é Clara Sola, filme que chega aos cinemas já nesta quinta-feira, 11. Ao contrário da protagonista do filme mexicano, Clara não tem sequer a opção de se relacionar. Ela está invariavelmente presa na assexualidade forçada por família e vizinhos.


Afinal, Clara (Wendy Chinchilla Araya) tem um problema ósseo que vai dificultando seus movimentos e sua postura. A família e os vizinhos, enquanto isso, a veem como uma mártir. É uma santa, que sofre no corpo pelos outros, sarando doenças -- da alma e do corpo. Uma encarnação de Nossa Senhora. No entanto, Clara não aguenta mais isso. Ela vê todos os seu redor satisfazendo desejos, vivendo a sexualidade. Ela, enquanto isso, fica presa nessa cápsula religiosa que a impede de ir além. Mais do que o problema ósseo, é a religião que a ata.

Com uma atuação dolorosa de Araya, que sabe como viver essa personagem que tem tantas limitações impostas. A panela de pressão dessa situação vai chiando, vai alcançando cada vez mais o seu limite. A intensidade de cena passa pela tela: nós, do outro lado, sentimos a tensão e a ânsia em Clara de ser mais do que aquilo que os outros impõem. Muito disso também vem da direção firme de Nathalie Álvarez Mesén, que faz sua estreia em longas após uma excepcional carreira de curtas. A forma de filmar Clara, sempre a fechando no quadro, aumenta a emoção.


Por fim, é interessante como Mesén nunca se rende ao óbvio ou ao piegas. Apesar das possibilidades de entrar nesse tipo de história e filmagem, exagerando na dose de sentimentalismo, Clara Sola é sóbria. Isso é certeiro para que a emoção, ao final, seja explosiva, chocante, inesperada. É como se o roteiro de Maria Camila Arias e Mesén deixassem tudo uma calmaria para que, quando chega a tempestade, as coisas passem por uma revolução. Por isso é um final tão marcante. O roteiro e direção nos acostumam de um jeito e encerram de outro.


Clara Sola, assim, é um dos bons filmes de 2022. Maduro, intenso e com boas atuações, o longa-metragem fala acertadamente sobre como a religião pode encapsular as pessoas dentro de uma bolha, tirando-a seus desejos, pretensões, ideias e até sexualidade. Fica aqui a dica de um programa como esse meu que fiz quase sem querer: assistir Clara Sola e Leona para ver essas diferentes facetas. São dois grandes filmes, cada um a sua maneira (ainda que, confesso, tenha gostado mais do mexicano). Já passou da hora de refletirmos sobre a religião na sociedade.

 

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