Difícil dizer, com precisão, de quando data a primeira história da Cinderela. Os irmãos Grimm foram os primeiros a transformá-la em texto, mas a fábula já corria entre povos no boca a boca. Depois disso, a trama voltou a ganhar força com a adaptação para os cinemas pela Disney, em 1950, no que viria a se tornar a representação definitiva dessa princesa. Depois, vieram outras releituras como o live action de 2015, a animação-paródia de 2007 e o clássico brasileiro com Carla Perez, de 1998. Agora, mais uma boa releitura chega ao cinemas nesta quinta-feira, 28, com o infantojuvenil Cinderela Pop.
Protagonizado por Maísa Silva e inspirado num livro de Paula Pimenta, o filme moderniza a história da princesa. Ao invés de uma garota quase medieval que sofre com os abusos da madrasta, uma adolescente convencional que vê seus sonhos interrompidos pela amante de seu pai. Ao invés de um sapatinho de cristal, um All Star. Ao invés da vida de gata borralheira, o desejo crescente de trabalhar com música e ser uma DJ de sucesso. A base, porém, continua a mesma: é o desenvolvimento da vida de uma garota que vê impedimentos na figura da madrasta e das duas enteadas maldosas.
Difícil dizer se o filme é um clichê ou não. Afinal, ele logo se assume como a releitura de uma história que ajudou a fundar uma série de clichês do cinema, como o príncipe galã, a figura bondosa que circunda a vida da protagonista, a princesa indefesa. No entanto, até que ponto é clichê essa releitura? Como dito acima, isso já foi feito à beça por aí -- até num filme protagonizado por Carla Peres e que se orgulha de ter a participação especial de Alexandre Pires. É, afinal, um filme que já tem um final conhecido, um desenrolar batido e personagens já conhecidos em todas suas camadas. Não muda.
O diferencial aqui está na modernidade da história e como ela deve fazer sentido para crianças e adolescentes. Pais e responsáveis, infelizmente, devem se entediar. Os pequenos, enquanto isso, devem se divertir ao reencontrar essa história, que pode ou não fazer parte do repertório deles -- afinal, estamos falando de crianças e adolescentes nascidos depois dos anos 2000. A pegada pop do diretor Bruno Garotti ajuda a dar uma leveza para a trama e torná-la de fácil digestão. E vale destacar que aqui ele não comete barbaridades que cometeu em Tudo por um Pop Star. Melhorou.
O que complica um pouco, e se torna indefensável, é o roteiro de Garotti, Flávia Lins e Silva e Marcelo Saback. Grande parte do trabalho aqui é de responsabilidade de Paula Pimenta, que escreveu o livro no qual o filme é baseado. O trio de roteiristas, enquanto isso, não conseguiu ir além. Muitos diálogos são sofríveis, artificiais e claramente complicam a vida dos atores. Além disso, cai num erro cada vez mais comum no cinema brasileiro: a narrativa que começa de um jeito, desenvolve de outro e encerra de outro completamente diferente. Em Cinderela Pop, o problema é a narração inicial que some.
O elenco também é complicado. Maísa (Carrossel) até que se sai bem, mas tem espaço pra melhorar. Letícia Faria Pedro (Detetives do Prédio Azul) e Kiria Malheiros (Flores Raras), as enteadas malvadas, estão ótimas em cena e convencem. Filipe Bragança (Eu Fico Loko) se sai bem num príncipe unidimensional. Quem está mal é Fernanda Paes Leme, que parece ter deixado os bons momentos de sua carreira nos anos 2000. Difícil entender como ela ainda é procurada para tantos papéis. Não funciona em cena.
Mas, novamente, este não é um filme pra adultos. Não é pra mim e, provavelmente, não é pra você que está lendo. É pros seus filhos, netos, sobrinhos, irmãos menores. É praqueles que ainda estão descobrindo as fábulas e começam a se aventurar no cinema com histórias mais modernas e reais, além da animação da Disney. É para o público que gostou de Tudo por um Pop Star, por exemplo -- sendo que este é milhas melhor. Vale para esse público, para os fãs de Paula Pimenta e de Maísa. O resto é só acompanhante.
Agora, é esperar os outros seis filmes baseados em obras de Paula Pimenta. Se mantiver a qualidade desse, vai ser divertido -- ainda que a quantidade soe exagerada.
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