O sistema político americano é uma bagunça para quem vê de fora -- e para muitos de dentro também. A divisão por estados, num sistema federalista, acaba complicando o entendimento das eleições e, acima de tudo, fazendo com que resultados sejam imprevisíveis. E é sobre esse complicadíssimo sistema que, de alguma forma, se debruça o longa-metragem Boys State.
Produção original para o Apple TV+, o documentário de Amanda McBaine e Jesse Moss (de The Overnighters) fala sobre esse tema espinhoso -- e um tanto quanto complexo -- a partir de um inusitado microcosmos. É um exercício de jovens, no Texas, que se reúnem por cerca de uma semana para emular uma eleição para governador, com partidos, candidatos e, claro, eleições.
E é nesse ambiente, inicialmente estranho e um tanto quanto juvenil demais, que o espectador é convidado a mergulhar no sistema eleitoral com todas as suas particularidades, estranhezas e injustiças. Para isso, McBaine e Moss acompanham ativamente alguns jovens. René é o líder dos Nacionalistas; Ben Feinstein é o líder dos Federalistas; e Steven Garza é o candidato ao governo.
A partir desse trio, e com mais alguns divertidos e inesperados jovens pelo caminho, o espectador conhece um pouco mais da divisão bipartidária dos Estados Unidos, entende as prévias, compreende os movimentos internos do partido e, sobretudo, vê que muitas vezes competência não é sinônimo de eficácia política -- como um determinado momento fica claro.
Boys State, assim, oferece dois caminhos para o espectador. Em um deles, há esse entendimento bruto sobre o sistema político americano, que deve ajudar os desavisados a entender um pouco mais sobre o assunto. Mas não é só isso: McBaine e Moss são felizes ao trazer reflexões profundas sobre o sistema político, com questionamentos e provocações.
É difícil -- e arriscaria dizer quase impossível -- chegar aos créditos sem pensar nos meandros da política. E ainda que seja um documentário muito focado no sistema americano de eleições, há coisas a serem pensadas e refletidas sobre o Brasil também. Fake news, polarização, uso massivo de redes sociais, espetaculização do debate. Tudo isso está presente aqui, na história.
Enfim. Boys State é uma excelente surpresa. Ainda que demore um pouco pra engrenar, ficando realmente bom a partir de uns 25 minutos, é um filme que consegue trazer uma situação real e, a partir da boa abordagem e do controle das entrevistas, consegue fazer com que o real significado da história vá além do que é registrado nas telonas. Um filme para ver e refletir.
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