Steve McQueen é um cineasta que mostrou sua força e seu potencial no cinema ao emplacar três grandes filmes em sequência: Hunger, Shame e 12 Anos de Escravidão -- por este último, aliás, levou o Oscar. Depois disso tudo, a expectativa ao redor dele só cresceu e, agora, é difícil aceitar algo menor do que a excelência. As Viúvas, novo thriller dramático do diretor, infelizmente, não consegue alcançar o nível das outras histórias. Ainda que moderno e profundo, o longa-metragem falha na tentativa de encontrar sua identidade própria ao misturar gêneros, tramas e objetivos.
A história, porém, é simples -- e conhecida do público. Um grupo de homens, liderado por Liam Neeson, vive de assaltos. Até que um deles dá errado e todos morrem numa emboscada. É aí que entram as viúvas do título. Veronica (Viola Davis), Alice (Elizabeth Debicki) e Linda (Michelle Rodriguez), ainda em luto, descobrem que herdaram uma dívida substancial de seus maridos, que tentaram roubar o dinheiro do candidato à vereador Jamal Manning (Brian Tyree Henry) e seu irmão Jatemme (Daniel Kaluuya). Estes, por sua vez, estão em briga política com Jack (Colin Farrel) e Tom (Robert Duvall).
A partir daí, o roteiro, escrito pelo próprio McQueen e por Gillian Flynn (a autora de Garota Exemplar), cria uma teia de situações, conflitos e gêneros cinematográficos para contar tudo. É uma confusão. Talvez por terem estilos bem particulares, e dissonantes, as coisas não se encaixam. É uma mistura estranha de um dramão sobre mulheres e racismo, como o próprio 12 Anos de Escravidão, misturado com uma trama de assalto ao melhor estilo de Oito Mulheres e um Segredo. Já pensou um filho entre esses dois filmes? Pois é. Não faz sentido nenhum e é isso que As Viúvas deseja ser.
Além disso, há erros pequenos de trama, mas que causam desconforto. O personagem de Liam Neeson (A Lista de Schindler) conta com uma subtrama interessante, mas pouquíssimo explorada. Incomoda. Além disso, há algumas facilitações de roteiro que não fazem sentido. Sem falar do ritmo arrastado, que deve fazer a maioria dos espectadores se cansarem. Os que buscam drama vão se irritar com a ação. Os que querem uma trama de ação vão se irritar com o drama. E o que busca um equilíbrio desses dois gêneros, coitado, vai ter que buscar o DVD de Dunkirk ou outro filme que saiba fazer isso.
Mas nem tudo é ruim, claro. McQueen não deixaria isso acontecer. A direção dele continua vistosa e original, ainda que nem faça sombra em sua fase europeia com Shame e Hunger. Tem charme, estilo, personalidade. E, curiosamente, as cenas de ação são muito bem realizadas. Pena que não investiu mais nisso. Iria surpreender e criar um marco no cinema recente. Talvez ele se solte mais em algum projeto vindouro.
O elenco também segura bem as pontas, ainda que de maneira menos uniforme. Viola Davis (Um Limite Entre Nós) cria bem sua personagem, que parece uma mistura do que foi visto em How To Get Away With a Murder e Sob Custódia. Elizabeth Debicki (O Conto) também segura em seu papel, um dos mais difíceis e complexos ali. O mesmo vale para Farrel (O Sacrifício do Cervo Sagrado), Duvall (O Juiz) e Rodriguez (Velozes e Furiosos 8). Mas tem um nome que consegue estar acima de todos os outros: Kaluuya (Corra!). Ele entra no papel de um jeito impressionante. Difícil não odiar com força seu personagem.
Vale ressaltar algumas das boas sacadas narrativas e visuais, que fazem críticas sociais e políticas de maneira inteligente. Uma pequena subtrama ao melhor estilo House of Cards, apesar de um pouco solta na narrativa como um todo, também funciona no geral.
E assim, ao final, As Viúvas é um filme confuso, estranho e que não tem identidade própria. Parece uma grande mistura de coisas que não ornam. Uma pena, já que McQueen é um cineasta de grande capacidade e Flynn, a roteirista, uma escritora de mão cheia. Mas o elenco e a direção com personalidade faz com que o filme seja passável, ainda que não deva ter força técnica e narrativa para chegar vivo ao Oscar.
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