Quando chegou aos cinemas, em 2012, o filme Histórias Cruzadas foi muito bem recebido. Afinal, falava sobre racismo de uma forma diferente, mais expansiva. Venceu, inclusive, alguns prêmios no Oscar. No entanto, anos depois, o filmo não é encarado do mesmo jeito. Afinal, a história usa a jornada de uma mulher branca (Emma Stone) para falar da comunidade negra.
Esse é um problema similar de Aos Dezesseis, pequeno livro publicado pela Editora do Brasil. Ainda que bem intencionada, a autora Annelise Heurtier comete o erro de balancear a trama entre uma garota negra e uma garota branca. A grande questão é que está não é um livro que deveria ser equivalente. Afinal, a história da garota negra é histórica, poderosa, profunda.
No livro, ela é uma das nove estudantes de Little Rock. Essa história, que aconteceu de fato nos Estados Unidos, acompanha um grupo de nove jovens negros que se voluntariam para serem os primeiros a estudarem numa "escola de brancos" no meio do sul norte-americano segregacionista. É um desafio e, acima de tudo, um risco. Afinal, o preconceito ainda toma conta.
Dessa forma, Aos Dezesseis tinha a obrigação de ser sobre essa garota, que aqui ganha o nome ficcional de Molly. Falar sobre a dor dela, sobre os desafios. Um mergulho completo na vida da menina. Mas não. Os capítulos do livro acabam sendo alternados com a história de Grace, uma garota que "nem é tão racista assim" e que sente dó da jovem Molly no meio de tanta violência.
Assim, no final das contas, o livro de Annelise Heurtier acaba tendo o mesmo problema de Histórias Cruzadas. Ou até mesmo de Green Book, vencedor do Oscar em 2019. Histórias de brancos são sobrepostas ou igualadas à histórias de negros em momentos que isso não deveria acontecer. Quem sofreu, de fato, foi Molly. Foram esses negros que desafiaram o sistema.
Oras, se a autora achou que a história da garota era pouco, contasse a trajetória de outros estudantes. Explorasse mais como eles enfrentaram esse racismo violento, perigoso. Mas não. Enfim: Aos Dezesseis tem boas intenções, mas uma execução pueril. Agora, destaco: gostaria muito de ver a história de Molly nos cinemas, talvez nas mãos de Spike Lee. Precisa ser contada.
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