Geralmente, o terrorismo assume uma fórmula muito parecida no cinema. São homens, frios e distantes da humanidade, que parecem ter vindo ao mundo apenas pra matar e causar um profundo sofrimento. São sempre muçulmanos, de barba e roupas típicas. É raro ver algum filme que siga num caminho contrário, mostrando as diversas facetas que um terrorista pode assumir. Por isso é preciso falar sobre o novo Adeus à Noite.
Dirigido por André Téchiné (Quando se Tem 17 Anos), o longa conta a história de uma família francesa que passa a andar ao lado do terrorismo. O motivo? Alex (Kacey Mottet Klein), o neto que mora no Canadá, volta para seu País para passar uma temporada na casa da avó Muriel (Catherine Deneuve), junto da namorada Lila (Oulaya Amamra). É aí que a matriarca descobre que ele, na verdade, quer se juntar a um grupo extremista.
A partir daí, Téchiné começa a construir uma narrativa que mostra como o extremismo religioso vai tomando conta das pessoas num nível quase patológico. Kacey Mottet Klein (Troca de Rainhas) entende seu papel muito bem, desde o começo, e vai aprofundando o nível de tormento que se passa em sua cabeça. Os conflitos internos e pessoais com a avó ajudam a dar o tom, que vai se intensificando ao longo dos 104 minutos de projeção.
No entanto, o grande ponto de Téchiné à favor do filme está no silêncio da relação entre a personagem de Deneuve (A Última Loucura de Claire Darling) com o neto. Ambos já parecem dessincronizados da vida, da realidade e do que entendem como o sentido de tudo. Ela observa o eclipse a olho nu, encarando o Sol de frente. Alex e a namorada, pelo celular. Falta comunicação entre a mente do rapaz com mundo real. É a deixa pro caos.
Até mesmo os planos de câmera do cineasta francês ajudam a dar o tom. Há sempre algo os dividindo na tela -- seja um vidro, uma mesa ou uma porta. Parece que a relação entre ele a avó, que o criou após a morte da mãe, está fadada à falta de comunicação.
Téchiné, porém, acaba tirando demais o pé no final do longa-metragem. Traz uma história de superação que até faz sentido dentro da lógica admitida pela roteirista Léa Mysius (do péssimo Os Fantasmas de Ismael), de desconstrução dos clichês admitidos no cinema americano. Mas as coisas acabam se tornando extremamente insossas, até desinteressantes. Falta um pouco mais de vitalidade, tão vista no resto do longa.
Ainda assim, Adeus à Noite é importante por fazer distinção do terrorista. Não é apenas um muçulmano, de roupas típicas, bradando na televisão com alguém sequestrado ao fundo. Pode ser um francês, um belga, um americano, um brasileiro. Basta ser alguém desconectado do mundo real e com uma porta aberta convidando o extremismo a entrar e fazer uma bagunça. Importante para refletir, discutir, pensar. Vale a assistida.
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