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Foto do escritorMatheus Mans

Crítica: 'A Vida Invisível' é belo e feminino melodrama


Na corrida pelo indicado brasileiro ao Oscar, três títulos se destacavam. Bacurau e A Vida Invisível brigavam pela principal vaga, enquanto o independente Sócrates parecia correr por fora. No final, acabou prevalecendo o melodrama de Karim Aïnouz. A Vida Invisível está lutando nas trincheiras das indicações ao Oscar. Mas o caminho não vai ser fácil. Ainda que seja emocionante, falta algo a mais no aclamado longa-metragem.

A trama conta a história de Eurídice Gusmão (Carol Duarte) e de sua irmã, Guida (Julia Stockler). As duas vivem num Brasil da década de 1950 onde os homens tocam suas vidas como bem querem, enquanto as mulheres precisam se submeter aos seus gostos, desejos, ordens. É um mundo pré-revolução sexual, afinal, e a sociedade do patriarcado prevalece. De lá pra cá, muito mudou no mundo feminino. Mas pouco no masculino.

A partir disso, Karim se vale da linguagem das telenovelas e, numa mistura de Lion e Entre Irmãs, vai tecendo essa jornada de duas pessoas que acreditam estar separadas por um oceano de distância -- mas, tristemente, moram inclusive na mesma cidade. Há delicadeza na forma como o cineasta faz a narrativa acontecer. Sem supetões, sem grandes alavancas emocionais. Tudo flui naturalmente, sem exageros.

A ambientação também é interessante, reconstruindo um Rio de Janeiro quase fabular. É quase impossível não mergulhar de cabeça no drama dessa potente reconstrução.

O que pega, porém, são dois pontos: a primeira parte que beira o desinteressante e o som. Sobre este último ponto, pode ser que passe batido para muitas pessoas. Mas há problemas claros no design de som, tendo alguns momentos prejudicados gravemente por essa falha técnica -- compare com o nacional Rasga Coração, de Jorge Furtado, que tem um desenho de som sensacional, por exemplo. Para os mais chatos, vai incomodar.

Quanto ao outro ponto, há de se convir que a grande coisa do filme é sua conclusão com Fernanda Montenegro (Central do Brasil). É forte, é emocional, é impactante. A atriz, já na casa dos 90 anos, é um espetáculo na tela. No entanto, os outros 130 minutos do longa transitam entre o arrastado, o lento e o desinteressante. Carol Duarte é uma atriz que ainda tem muito a aprender e não consegue segurar momentos-chave de emoção.

Julia Stockler, enquanto isso, é uma boa surpresa na tela -- segura, confiante e sabe lidar com a emoção de sua personagem. É instável, portanto, a forma como as coisas se desenvolvem. De um lado, há uma frieza exagerada, uma falta de emoção. Do outro, há uma atuação interessante, profunda. Nessa dualidade, o longa-metragem vai deixando suas fragilidades mais evidente e o tom de melodrama, por vezes, acaba se perdendo.

O mais triste, porém, é que mesmo tendo a excelente recriação, há muito pouco de brasileiro no longa-metragem. É uma história universal demais e que vai na contramão do que Bingo: O Rei das Manhãs apresentou ao Oscar no ano retrasado, quando tinha uma história específica demais, nichada apenas pro público brasileiro. Esta, enquanto isso, poderia se passar em qualquer lugar. Falta um pouco mais de alma, de força.

No final, é praticamente impossível não traçar paralelos com os outros possíveis indicados do Brasil. Os três são bons filmes, mas há diferenças. Sócrates é um cinema independente bem feito, bem contado, bem atuado. Redondinho. Bacurau, enquanto isso, dá um banho nesta obra de Karim Aïnouz -- é mais brasileiro, mais urgente, mais forte. Sem dúvidas, teria muito mais chance no Oscar 2020. O que nos resta é torcer.

(*) Filme visto durante cobertura da 43ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.

 

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