Inga (Arndís Hrönn Egilsdóttir) é uma produtora de laticínios em uma pequena comunidade agrícola islandesa, e acaba de ficar viúva. À frente da fazenda, ela decide começar uma vida nova em seus próprios termos, se rebelando contra a corrupção e injustiça em um esquema de monopólio, comandado pela poderosa cooperativa local.
Esta é a trama do islandês A Resistência de Inga. Dirigido por Grímur Hákonarson (do ótimo A Ovelha Negra), o longa-metragem parece distante da realidade do brasileiro -- afinal, o que uma comunidade de produtores de leite, no interior da Islândia, pode ter a ver com nosso País tropical? No entanto, conforme a trama avança, paralelos surgem.
A jornada de Inga, afinal, é a mesma de qualquer outra pessoa que desperta para um senso de justiça que deveria permear a vida de todos. Sua intolerância com o monopólio que rege sua vida causa emoções no público, que automaticamente fica ao lado da protagonista. Mesmo ela sendo fechada e de poucas palavras, a empatia surge na tela.
Além disso, o esquema de corrupção da cooperativa, que é quase mafioso, conversa com histórias já vistas no Brasil. Tem como não se ver nos campos gelados do filme?
Dessa forma, a partir de um minucioso olhar para detalhes, Hákonarson constrói uma trama que vai do individual ao coletivo. Inga, que lembra a personagem de Frances McDormand em Três Anúncios para um Crime, representa a intolerância ao errado, ao injusto, ao massacre dos grandes em cima dos pequenos. Inga é o que todos somos.
Além disso, Arndís Hrönn Egilsdóttir (Pardais) toma conta do filme. Potente e certeira de sua personagem, a atriz compreende todos os meandros que pode explorar na telona e o faz sem medo. Inga cresce em potência e em força apenas com olhares, gestos, modos de lidar com a fazenda. Egilsdóttir, sem dúvidas, faz algo marcante por aqui.
No entanto, apesar da boa protagonista e do interessante tom da trama, falta mais resistência, de fato. Tema cada vez mais frequente no cinema contemporâneo, há uma boa distância entre A Resistência de Inga e outros longas com a mesma temática, como Aquarius, Bacurau, Parasita. Falta potência na jornada interpessoal de Inga.
Para fazer um paralelo direto, falta a cena em que Sônia Braga "coloca o pau na mesa". Falta a cena do enfrentamento entre moradores de Bacurau com estrangeiros. Falta a cena do aniversário de Parasita. Falta uma sequência que pegue o espectador pelos ombros e o chacoalhe, para que ele entenda e compreenda melhor o que há ali.
Pode ser que Hákonarson não tinha essa intenção -- o final, de um jeito ou de outro, é interessante e emocionante. Mas, sem esse ponto a mais e com concorrentes temáticos diretos, A Resistência de Inga não se torna memorável. É bom, sim. E bem realizado como direção. Mas um pouco mais de potência narrativa e cênica não faria mal algum.
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