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Foto do escritorMatheus Mans

Crítica: 'A Aparição' é drama provocativo, mas com tramas demais


Anna (Galatéa Bellugi) é o centro das atenções de todo o mundo. Órfã e noviça em um convento, a jovem diz ter se deparado com a aparição da Virgem Maria enquanto andava pela sua cidade, no interior da França. Logo cria-se um circo midiático, como é de praxe nessas situações, e milhões de olhos recaem sobre sua figura cálida, simples e frágil. Inclusive do Vaticano, que envia um grupo de investigação para apurar melhor o tal de aparição.

Quem lidera esse "santo" grupo é Jacques (Vincent Lindon), um jornalista que acabou de perder o melhor amigo e que aceita a tarefa como uma forma de escapar momentaneamente de seus problemas do mundo real. Junto com ele, está um padre, um teólogo e uma psiquiatra, que tentaram provar -- ou negar, de acordo com o caso -- a história contada pela noviça, amparada pelo padre local e por pessoas interessadas.

A direção é de Xavier Giannoli, responsável pelo mediano Marguerite -- história da "pior cantora do mundo", que também ganhou versão com a Netflix. Como já visto no outro filme, o cineasta francês está adotando, cada vez mais, um ritmo lento, contemplativo e que não se limita. O objetivo é deixar a história se levar, sem interrupções ou quebra bruscas de ritmo, deixando que todas as situações possíveis se desenrolem para melhor compreensão.

Esse aspecto empregado por Giannoli, que assina o roteiro, traz um aspecto positivo e outro negativo. O primeiro é sobre a questão dos personagens. Extremamente bem desenvolvidos, é fácil entrar no clima criado pela personalidade de cada um. Independente de concordar ou não com suas posições, atos ou ideias, todos eles são plausíveis e compreensíveis a partir de determinadas óticas, realidades e situações.

Tudo isso é elevado pelo elenco. Vincent Lindon, novamente, faz um papel mais introspectivo, contido, silencioso -- como no sensacional O Valor de um Homem, por exemplo. Trabalho sensacional de direção em conjunto com os atores, permitindo que seja sentida cada camada de suas intenções. Galatéa Bellugi, quase desconhecida, também se sai bem como Anna, dando uma dualidade necessária à personagem. Vai longe.

O problema do aspecto de Giannoli, de deixar a trama correr, é a sua complexidade que nunca é resolvida. Com uma situação tão interessante, da menina pura que vê a imagem da Virgem Maria, há dezenas de coisas a serem desenroladas daí. E Giannoli desenrola quase todas as possibilidades: o circo midiático, o enclausuramento da jovem, abuso religioso, embates internos da Igreja, vida de jornalista estrangeiro, dramas familiares.

E assim, nessa teia, pouca coisa se sobressai e, rapidamente, é possível pensar em outros filmes que trabalhem temas específicos de maneira superior. Do circo midiático ao redor de um fato excepcional, por exemplo, A Montanha dos Sete Abutres. Sobre aparições de imagens santas, o próprio Bernadette. Sobre os embates dentro da Igreja, A Dúvida. Essa falta de aprofundamento não seria problema se o final amarrasse tudo. Mas não.

A conclusão criada por Giannoli é corajosa, interessante e, em partes, necessária. O arco da personagem Anna é absolutamente redentor. O problema é que todas as outras histórias abordadas em cima dessa peça principal não são concluídas. Tudo fica meio solto, sem dar um nó em tudo. Claro: não precisaria, por exemplo, mastigar todas imagens visuais e narrativas num final didático. Mas seria interessante ter uma conclusão, de fato.

Assim, Aparição tem uma base muito sólida: o drama de uma garota após ver a aparição da Virgem Maria. Tudo isso, aliás, embasado por ótimos personagens. O problema, porém, fica com a grandiosidade que Giannoli tenta abraçar, mas não consegue. Apesar de suas quase 2h30, o filme acaba ficando vazio e incompleto. O estilo de Giannoli é muito prazeroso, mas precisa ser um pouco podado. Boas histórias podem se perder aí.

 
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