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Foto do escritorMatheus Mans

Crítica: '1917' é primor técnico que peca pela falta de narrativa


Filmes com fiapos de narrativa podem ser uma grande diversão para que cineastas explorem e experimentem o cinema. Veja Whiplash e Mad Max: Estrada da Fúria, por exemplo. São dois longas com histórias breves, bem simples, mas que possuem cineastas em sua melhor forma, dando ritmo e estilo ao filme com a noção de que, no fim do dia, precisa dar algo ao espectador.


Isso mesmo: o diretor, de alguma forma, precisa colocar o público na sua história, no seu filme. Se Whiplash e Mad Max não tivessem bons personagens e boas histórias, não haveria identificação com o público. Os filmes seriam esquecidos. No máximo, lembrados como aquele bom filme de Damien Chazelle ou bom filme de George Miller. Mas há mais aqui. Muito mais.


Há, por exemplo, personagens complexos, que passam por grandes provações em vários sentidos. Há, também, mensagens que permeiam bons diálogos e os tipos criados, no geral. A experiência, assim, é positiva, memorável e identificável. O espectador, por um lado, se empolga com a criação livre do diretor, ao mesmo tempo que se envolve com a história que é contada.


Além disso, o roteiro possui estruturas que validam o fiapo de narrativa. Em Whiplash, cenas de música que valem como sequências de perseguição. Em Mad Max, a estrutura pouco usual.


E é isso que falta em 1917, novo longa-metragem do diretor Sam Mendes (007: Operação Skyfall) e um dos favoritos na corrida pelo Oscar. Filmado em aparente plano-sequência, o filme conta a história de dois soldados britânicos (Dean-Charles Chapman e George MacKay) que são designados a invadir o campo inimigo, na Primeira Guerra Mundial, para levar uma mensagem.


A partir daí, Mendes explora as dificuldades dessa jornada e o ardor da provação, colocando essa dupla de soldados numa tentativa desesperada de conseguir cumprir a missão entregue.


O cineasta, obviamente, está em forma aqui -- assim como seu excepcional diretor de fotografia, o lendário Roger Deakins, vencedor do Oscar por Blade Runner 2049. A sensação de plano sequência é interessante e, de alguma forma, ajuda a colocar o espectador para dentro do clima desesperador de uma Primeira Guerra Mundial. A falta de cortes causa desespero e ansiedade.

Algumas sequências são, aliás, difíceis de entender como foram feitas. A do rio e a da corrida por fora da trincheira, principalmente, são históricas e ficam martelando na cabeça depois.


No entanto, 1917 não vai muito além disso. É aquele filme que você vai sair da sessão falando "uau, como foi bem feito", "nossa, que cena bacana", "caramba, plano-sequência, né?". Mas, depois de um tempo, vai lembrar do filme unica e exclusivamente por causa disso. A história dos soldados de Chapman (Game of Thrones) e MacKay (Capitão Fantástico) sumirá como fumaça.


Isso mostra como o roteiro, escrito pelo próprio Sam Mendes e por Krysty Wilson-Cairns, e inspirado em histórias reais do avô do cineasta, não possui aquele "clique" que torna o filme mais especial e empolgante. A história é linear, com um ou outro momento de espetáculo, mas que acaba sendo sacrificada pelo espetáculo visual e técnico. É muito visual e pouco conteúdo.


Dessa maneira, trazemos a discussão: o quão bom é um filme assim? Ok, ele pode ser impressionante e outras coisas do tipo. Mas ele é um filme perfeito? É um filme assim que deve ganhar o Oscar? Falta, aqui, aprofundamento dos personagens -- nem que seja com uma cena, um diálogo, um momento. Falta história. Falta coesão. Falta um momento "uau" por completo.


Isso, é claro, não tira de 1917 os méritos técnicos e visuais -- o prêmio de fotografia merece ir para as mãos de Deakins, assim como deve ser considerado as vitórias em prêmios de sons. No entanto, o cinema sempre foi a arte de contar histórias. Mesmo quando simples e breves, como nos dois casos citados acima. A ausência de uma história para ser lembrada é problemático.


É, em resumo, um filme que sobra em razão e falta em emoção. É um filme que prioriza a forma de fazer as sequências e esquece de como elas podem emocionar e impactar a audiência.


Aqui, você sente e sofre pelos protagonistas, em sequências de tirar o fôlego, mas não os compreende. Não entende o que há por trás daquelas pessoas, daquelas histórias e figuras. O aspecto unicamente humano -- que funcionou em tramas como Até o Fim -- não é o bastante aqui. A guerra possui heróis e vilões. É preciso ter barreiras definidas para cada um deles.


Dessa maneira, 1917 é o filme mais bem realizado tecnicamente da temporada. É bem dirigido, bem fotografado, bem coreografado e bem atuado -- MacKay merecia emplacar uma indicação ao Oscar. No entanto, a pouca história o prejudica e faz com que seja esquecível. Se vencer o Oscar, será como Green Book. Um filme que, daqui algum tempo, poucos lembrarão detalhes.

 
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