A Balada de Buster Scruggs nasceu como um projeto televisivo dos irmãos Joel e Ethan Coen para a Netflix. A ideia era produzir uma minissérie, de seis episódios, em formato antologia com a temática do faroeste em todas suas faces e possibilidades. Só que na reta final da produção, os diretores, responsáveis por O Grande Lebowski, Onde os Fracos Não Têm Vez e Bravura Indômita, resolveram voltar atrás e compilar as histórias em um único filme de 132 minutos. E é esta produção que chegou ao catálogo da Netflix na última sexta, 16.
O resultado é excelente, como já é costume nas produções dos Coen. Boa fotografia, bons atores, boa trilha sonora e, principalmente, roteiros bem elaborados e encaixados. Mantendo, entre eles, muito mais do que o Faroeste como fio narrativo. Violência, destino e morte servem como união entre as partes, dando uma coesão no episódico só vista em Relatos Selvagens. E não é exagero compará-lo ao filme argentino. Abaixo, os seis motivos -- divididos por episódios -- para dar uma chance para A Balada de Buster Scruggs:
1. 'The Ballad of Buster Scruggs'
O primeiro segmento é o que dá nome ao filme e que serve, de certa feita, como uma introdução ao que os Coen pretendem contar dali pra frente. Afinal, com um ar musical pomposo (como foi visto no filme anterior da dupla de cineastas, Ave, César!) e trazendo algumas das lendas do Faroeste, há tudo o que se espera de um western. A mão dos irmãos Coen também está mais forte ali, fazendo com que a realidade ao redor do personagem Buster Scruggs (Tim Blake Nelson) não seja totalmente coerente e lógica -- o que dá espaço para o humor sombrio. Destaque, aqui, para a trilha musical original e para a atuação de Tim Blake (Dívida de Honra), tragicômico na medida certa da trama.
2. 'Near Algodones'
É o mais estranho e descolado da narrativa, sendo bem mais curto e menos desenvolvido do que os demais. Talvez, até mesmo, por conta do protagonista ser James Franco (Artista do Desastre), ator que está num limbo profissional após acusações de assédio sexual. Mas, ainda assim, o fio condutor está lá por meio da violência, da morte, da quebra de expectativa e do humor negro. A trama, curiosa, acompanha um homem (Franco) que tenta assaltar um banco, mas acaba sendo pego por um homem sombrio (Ralph Ineson). O grande ponto do filme é a sua conclusão, quando os irmãos Coen constroem uma reviravolta difícil para um curta-metragem. Mas parece que falta algo, algum ápice para que a trama se complete ao seu final Uma pena.
3. 'Meal Ticket'
A mais controversa das histórias apresentadas pelos Coen, mas a mais lírica e a mais melancólica. Acompanha dois artistas (Liam Neeson e Harry Melling) que viajam pelo Oeste americano em busca de alguns trocados. Neeson (A Lista de Schindler) é o "cabeça" por trás dos negócios, enquanto Melling (Z: A Cidade Perdida) é o artista e o que põe a cara a tapa. Trágico e com pouco espaço para o humor, essa historieta pega pela tragédia e pela melancolia de seus atos. Neeson está bem, mas é Melling que rouba a cena numa interpretação surpreendente. A lentidão da trama, porém, pode atrapalhar o andamento do longa-metragem e funcionaria melhor, sem dúvidas, dentro de um formato de série.
4. 'All Gold Canyon'
A melhor história das seis e que deixa todos os elementos comuns do longa-metragem se exacerbarem de maneira inteligente e controlada. A trama acompanha um rabugento minerador (Tom Waits), andando pelo Oeste intocado, em busca de ouro. Ainda que a atuação de Waits (Sete Psicopatas e um Shih Tzu) esteja boa, o que salta aos olhos aqui é a fotografia deslumbrante de Bruno Delbonnel (Across The Universe), que faz com que a ambientação, acertadamente, se torne um personagem daquela trágica história. Curioso, também, os elementos fantasiosos empregados pelos Coen, que ajudam a dar o tom e a fazer com que o espectador entre de cabeça no Velho Oeste. Absolutamente genial.
5. 'The Gal Who Got Battled'
História que deve despertar emoções na audiência -- e que, de certa forma, deve ser outra favorita ao "prêmio" de melhor trama junto com All Gold Canyon. Ela acompanha uma comitiva pelo deserto do Oeste americano com a cidade de Oregon como destino. Nela, está Alice Longabaugh (Zoe Kazan), uma jovem que acompanha seu irmão por conta de negócios. Porém, logo após uma inesperada reviravolta, os planos são alterados e o cenário, antes de oportunidades, passa a ser de incertezas. Isso a faz se aproximar de Billy Knapp (Bill Heck), um dos guias da caravana. Com ares românticos, mas sem deixar o non sense e a violência de lado, os Coen constroem uma trama coesa, forte em significados e com um final extremamente agridoce, como é difícil de causar. Pena que é um pouco longa demais por conta de um roteiro com rebarbas e excessos.
6. 'The Mortal Remains'
Ainda que Near Algodones seja o mais estranho dentro da proposta do longa, é de The Mortal Remains o posto de pior história. Mesmo que tenha os elementos referentes ao fio condutor da trama, ela é a mais distante de alguma proximidade com o Faroeste e a menos interessante -- ainda que tenha a presença de Brendan Gleeson (Calvário). O roteiro exagera no tom, ainda que as críticas sociais, econômicas e étnicas sejam bem-vindas. Fica verborrágico demais, teatral em demasia. Falta um pouco mais de cinema aqui, um pouco mais das boas histórias que foram contadas até o último conto. Há, porém, algo para ser elogiado: a conclusão interessante, aberta à interpretações, e a mostra que pode ser feito de quase tudo dentro do Faroeste, por mais distante que The Mortal Remains esteja do gênero. A conclusão de A Balada de Buster Scruggs não é boa, mas, mesmo assim, fica a sensação de um grande filme de 2018.
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